Sobrenatural sem sustância
por Barbara DemerovFilmes que se passam no decorrer de um recorte do presente (seja uma noite, três dias ou uma semana) já causam certa curiosidade devido à urgência que a narrativa e seus desdobramentos naturalmente possuem. Existem casos, como o do suspense Um Lugar Silencioso, em que algumas perguntas podem permanecer sem respostas e, ainda assim, manter o espectador idealizando o que pode ter acontecido no passado e o que ainda pode ocorrer após os créditos finais. Este, no entanto, não é o caso de Brightburn - Filho das Trevas – pelo menos não de um modo positivo. É surpreendente ver como uma boa ideia pode se perder diante de um roteiro mal resolvido que, por focar tanto no imediatismo, acaba se esquecendo de algo que importa ainda mais: de uma origem concreta.
Brightburn conta uma história parecida com a de Superman, pois Brandon (Jackson Dunn) é de fato um ser poderoso que literalmente cai do espaço para a Terra enquanto bebê. Assim como Clark Kent, Brandon é criado como ser humano por seus pais adotivos, Tori (Elizabeth Banks) e Kyle (David Denman), que sabem desde o início o quão especial é a criança, considerada um presente visto que o casal não consegue engravidar. O problema é que, ao invés de criar um ambiente em que Brandon tenha a capacidade de entender o que é moral ou imoral, o longa de David Yarovesky contenta-se em apresentar somente o básico: o bullying dos colegas na escola por ser inteligente demais, a frustração de uma primeira paixonite, o "não" recebido pelo pai.
Assim, a virada de chave no íntimo de Brandon, aos 12 anos, acontece modo brusco e superficial. Se ao menos soubéssemos de onde ele veio, assim como ocorre com Superman, essa história poderia ter uma semelhança mais ampla; mas tal comparação de Brandon ser um "Superman ao contrário", algo absolutamente normal só de assistir ao trailer, soa completamente forçada quando o material completo é visto. Além da capa vermelha e do raio laser, não há nada que remeta a um herói ou a um vilão de peso. Brandon é apenas um garoto de outro mundo (ou universo, ou galáxia...) cuja missão lhe é explicada com a mesma rapidez e frugalidade que sua mudança no caráter.
A falta de background do protagonista, que poderia muito bem ajudar o filme a se encaixar como uma ode aos vilões que superam a necessidade de maiores explicações (vide Michael Meyers, de Halloween), é parcialmente reparada pela trama dos pais de Brandon. Elizabeth Banks entrega uma atuação sincera e que demonstra a preocupação de muitos pais quando estes veem seus filhos com comportamentos mais rígidos e até mesmo grosseiros, e a conexão que é feita com a maldade de Brandon ser inicialmente vista como puberdade é interessante. Porém, do ponto de vista do espectador, algumas atitudes do casal tornam-se risíveis. A dificuldade da mãe em ver a maldade crua do filho adotado ultrapassa qualquer limite (até com provas de um assassinato), assim como o pai também se transformar de um carinhoso protetor a alguém que não reconhece mais a criança que criou, são elementos postos com uma velocidade que não acerta o alvo de tornar essa ruína familiar mais crível.
Até mesmo antes de se tornar o mal em pessoa, Brandon não emana qualquer expressão de afeto por quem está à sua volta. O "chamado" que recebe do mal (não é possível saber se é uma entidade ou uma civilização distante) surge sem explicação – o que com certeza seria bem vindo para expandir a atmosfera de suspense criada no ambiente familiar no campo, que prende a atenção no primeiro ato. Após descobrir a grandeza de seus poderes, o filme cede espaço para o slasher, o que acaba resultando em bons momentos (como na casa da tia de Brandon), mas que na verdade passeia por este gênero apenas para impactar visualmente. As cenas de mortes não deixam de ser bem feitas, mas só evidenciam a fraqueza no desenvolvimento do jovem protagonista. De onde vem tanto ódio, uma vez que sua introversão não é trabalhada com força para se tornar uma catarse?
A história do garoto que se perde diante de tanto poder e da família que neglicencia a verdadeira face de seu presente dos céus tinha potencial de sobra para se sobressair como drama interpessoal e um verdadeiro gore, mas limita-se a deixar, propositalmente, perguntas já sem muito embasamento a fim de provocar o público a refletir sobre o que viu. Brightburn é uma ótima amostra de como o terror pode acabar sendo ineficaz mesmo diante de uma ideia interessante.