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    Geração Riqueza
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Geração Riqueza

    A busca pela riqueza é uma forma de doença

    por Bruno Carmelo

    A diretora Lauren Greenfield explica a gênese deste documentário através de sua trajetória profissional: trabalhando como fotógrafa há décadas, ela começou a se interessar pelo modo de vida das pessoas mais ricas no mundo, publicando livros e expondo ensaios sobre bilionários chineses, donas de casa riquíssimas na Rússia, adolescentes multimilionárias nos Estados Unidos (incluindo Kim Kardashian) e mesmo o atual presidente norte-americano, Donald Trump. Formada em antropologia visual em Harvard, ela deseja entender como funciona a cabeça daqueles que têm tudo, mas ainda querem mais.

    Generation Wealth retoma fotografias das últimas décadas, além de uma vasta pesquisa com psicólogos, sociólogos e com os modelos entrevistados por Greenfield desde os anos 1990. A grande ambição deste projeto é compreender o capitalismo desde os anos 1970, quando passamos da “sociedade da produção à sociedade do consumo”, de acordo com a narração. Algumas teses são apresentadas ao público: 1. As pessoas desejam não apenas ter muito, e sim ter mais do que o outro, 2. Nós abandonamos os padrões de vida reais para nos inspirar na rotina dos ricos e famosos apresentados na televisão, 3. A crise do consumo se acentuou desde a quebra dos bancos islandeses em 2008, 4. Riqueza vai muito além de dinheiro, compreendendo também a fama, o status, a beleza e a impressão de saúde, 5. A busca incessante por riqueza corresponde a uma forma de doença.

    É óbvio que o documentário não teria capacidade de se aprofundar nestes temas, visto que cada um deles geraria material suficiente para uma tese de doutorado. A montagem se articula como pode, às vezes de modo bagunçado, mas incluindo indícios suficientes para sustentar cada uma destas ideias. A diretora procura afinar seu tema à medida que faz o documentário, e o resultado em tela corresponde a um laboratório de ideias evocadas ao longo da pesquisa. O ritmo é agradável graças às boas doses de humor involuntário extraído dessas pessoas que fazem réplicas da Casa Branca em seus terrenos na China ou revestem um cômodo inteiro com ouro. Greenfield admite buscar os extremos para tentar compreender a média. Soma-se ao resultado o fato de a cineasta possuir fotos excelentes, com bom uso da nitidez e do flash para representar um luxo decadente e grotesco.

    Um recurso curioso do documentário é a autoexposição da cineasta diante das câmeras. Ela faz questão de mostrar que não está excluída deste funcionamento, ou seja, também busca a riqueza a qualquer preço e sofre as consequências disto. No caso dela, a obsessão seria pelo trabalho, que a tira de casa durante muitas semanas e a priva de tempo com os filhos. Se por um lado a autoconsciência de Greenfield parece sincera e válida do ponto de vista metodológico, por outro lado transforma o resultado numa espécie de mea culpa e terapia familiar. A diretora entrevista os próprios pais, questionando-os sobre os seus métodos de educação e perguntando se têm arrependimentos. O lado biográfico de Generation Wealth torna seu tema ainda mais amplo, mais distante do foco original.

    No entanto, a estrutura do filme é comprometida sobretudo pela conclusão. Após investir num estudo sério e acadêmico sobre as origens e consequências da riqueza, o desfecho abandona estas reflexões para lançar uma mensagem única: o dinheiro não traz felicidade. A montagem passa a articular depoimentos de todos os entrevistados dizendo que negligenciaram os seus filhos, colocaram as carreiras em risco, perderam a casa, foram à prisão. Uma música triste embala este segmento moral, no qual Greenfield também se insere, dizendo que fará o possível para ser uma mãe mais presente. A ideia de que riqueza é sinônimo de derrota moral e falência da instituição familiar se assemelha aos dogmas católicos, impedindo que o estudo aponte caminhos futuros para o capitalismo e investigue modos saudáveis de atenuar a concentração de renda. Generation Wealth se sai muito melhor quando faz perguntas do que quando fornece respostas.

    Filme visto no 68º Festival Internacional de Cinema de Berlim, em fevereiro de 2018.

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