Movida por seus ideais
por Barbara DemerovInspirado na história real de Melita Norwood, famosa espiã inglesa que ajudou a União Soviética ao longo de 30 anos, A Espiã Vermelha, filme sobre traição e romance, tem como base contar a trajetória da personagem Joan (Sophie Cookson) através de seu passado, deixando os fatos do presente como meros coadjuvantes. Apesar desta conjuntura ser interessante pela liberdade em compor o passado com uma riqueza de detalhes, é impossível deixar de lado que Judi Dench, intérprete de Joan no presente, é sub-aproveitada dentro da trama.
Além de poucas cenas com Dench enquanto é investigada pelo governo britânico, Cookson também não possui tantos momentos para brilhar – mesmo que com uma maior atenção aos seus ideais e a proximidade com o comunismo. O filme dirigido por Trevor Nunn é padronizado demais frente à uma protagonista que literalmente mudou o rumo da pesquisa nuclear da Rússia e, deste modo, acaba por entregar um resultado sem nuances ou twists capazes de impressionar. Se não fosse pelo fato da protagonista ser investigada (o que remete a O Jogo da Imitação), a linearidade de A Espiã Vermelha no passado talvez não fosse capaz de dar a devida importância a este caso.
Apesar de dar bastante atenção ao movimento comunista e a corrida armamentista nuclear durante a Segunda Guerra Mundial, o longa procura dar espaço ao quão importante foi o fato de Joan ter sido uma mulher cientista, formada em Cambridge, trabalhando em meio a inúmeros homens. Sem soar didático demais mas levantando a bandeira da representatividade feminina, este é um bom ponto dentre o que nos é apresentado nos dias da personagem enquanto jovem.
Sob o argumento de evitar com que a Guerra persista por muito mais tempo após ver o poder das mesmas bombas que ajudou a construir, é interessante ver como Joan não se enquadra como comunista mesmo auxiliando secretamente a US. Em alguns momentos ela chega a criticar fortemente Stalin em uma reunião do partido comunista na faculdade, o que deixa alguns colegas (incluindo seu interesse amoroso) um tanto quanto perplexos.
Quanto ao romance inserido na trama, não há profundidade suficiente. O personagem Leo (Tom Hughes), alemão corajoso e totalmente engajado na causa contra os ingleses, é visto mais como uma muleta do roteiro para entregar a parcela de drama na vida de Joan e, principalmente, ser a maior causa de conflito da jovem entre se tornar ou não uma espiã da KGB. A intensidade e a paixão entre ambos não convencem nem por um momento, mesmo que o casal se relacione ao longo de muitos anos. O que pode ser chamado de maior twist, aliás, é citado de modo tão apressado que se importar de verdade com o rumo daqueles personagens se torna algo realmente difícil. Há algumas pontas soltas que não são capazes de nos deixar intrigados – pelo contrário, só deixam a história com mais lacunas.
Com o protagonismo de alguém que foi capaz de mudar o rumo de pesquisas e projetos secretos na Segunda Guerra, A Espiã Vermelha possuía potencial de sobra para retratar um cenário repleto de dilemas morais e questionamentos internos perante ao governo. Contudo, o filme não se beneficia disso e resume-se a mostrar mais o glamour exposto no figurino e nas belas locações do que propriamente ser tão arriscado e inventivo quanto a mente feminina que acompanhou de perto planos confidenciais e seguiu seu ideal por tantos anos.