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    Morte no Nilo
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Morte no Nilo

    Clássico "quem matou?" não impressiona, mas dá certo

    por Aline Pereira

    A fórmula de “quem matou?” é uma das mais antigas da ficção e continua funcionando porque se baseia em uma característica humana universal: a curiosidade. Mas justamente por já ter sido repetida incontáveis vezes, é sempre mais interessante quando uma produção faz a escolha de “temperar” o mistério - basta lembrar do cativante Entre Facas e Segredos, que mereceu até uma sequência. Baseado na obra de Agatha ChristieMorte no Nilo dispensa qualquer pitada de novidade, mas comprova que o feijão com arroz até que vai bem. 

    Ambientado na década de 1930, Morte No Nilo começa quando Jacqueline (Emma Mackey, estrela de Sex Education), apresenta o noivo, Simon (Armie Hammer, em sua última aparição nas telas), à melhor amiga, a herdeira riquíssima Linett (Gal Gadot). Assim que Linett coloca os olhos em Simon, uma faísca se acende: a socialite e o homem se apaixonam, se casam, e Jacqueline, atormentada, começa a persegui-los.

    Hercule Poirot: detetive de Agatha Christie é a melhor parte de Morte no Nilo

    Temendo pela própria segurança, Linett chama o detetive Hercule Poirot (Kenneth Branagh, que também dirige o filme) para acompanhar o casal e seus conhecidos em um cruzeiro pelo Rio Nilo. Como em todos os mistérios de Agatha Christie, uma morte em circunstâncias misteriosas torna todos os passageiros suspeitos e dá a Poirot a tarefa de descobrir quem é o assassino.

    Os primeiros minutos de Morte no Nilo são animadores e apresentam uma inesperada perspectiva de “história de origem”: somos levados à juventude do clássico detetive para entender melhor seus traumas, com um flashback surpreendente que explica até o porquê do bigode gigante - uma trama triste, mas peculiar e interessante de acompanhar. Kenneth Branagh retorna ao papel de Poirot cinco anos depois de Assassinato no Expresso do Oriente, com o mesmo tom excêntrico da adaptação anterior, mas, por conhecermos agora seu passado, há uma sensação de maior profundidade e proximidade com o personagem.

    Por meio do flashback, o filme faz uma boa escolha para conectar Poirot ao grande mote de Morte no Nilo: as loucuras cometidas em nome do amor. O contexto sobre o personagem não está tão ligado à resolução do mistério propriamente dita, mas tornar o investigador mais sensível à tragédia amorosa nos ajuda a deixar de lado o fato de que ele parece ter caído sem motivo aparente no caso de Linett, Simon e Jacqueline. 

    Filme demora para engrenar: sem morte e sem Nilo

    Para uma história que se baseia no mistério de “quem matou?”, Morte no Nilo leva um bom tempo para, de fato, apresentar a morte e o famoso rio egípcio. A primeira parte do filme é longa e contextualiza demais uma premissa simples de traição e segundas intenções que fica clara logo nos primeiros minutos. Assim, acaba só alongando a explicação de algo que já estava mais do que compreendido. Antes de tentar descobrir quem é o assassino, o público vai precisar esperar quase uma hora para saber, primeiro, quem morreu. E se grande atrativo de histórias como estas é entrar na visão do detetive para solucionar o mistério, a demora em dar a largada certamente vai incomodar os mais apressados.

    Pois bem, quando uma morte finalmente acontece, o longa começa a apresentar as possíveis motivações de seus personagens suspeitos. Sem novidades por aqui: características clássicas como inveja, ganância, ressentimento e vingança aparecem entre eles e o público é convidado a fazer suas apostas - o momento que todos esperavam pacientemente. Mas aqui, algo curioso acontece: apesar de ter atores individualmente carismáticos, é estranha a dinâmica deles como um conjunto.

    Elenco de Morte no Nilo é cheio de estrelas e polêmicas

    Primeiro, é muito difícil não pensar em todas as controvérsias sérias nas quais Armie Hammer se envolveu toda vez que ele surge na tela. Sendo um dos protagonistas, o ator está em cena quase o tempo inteiro - o que deve ter sido uma dor de cabeça sem fim para o estúdio, sem ter como simplesmente cortá-lo. O mesmo acontece com Letitia Wright, que tem aparecido em conflitos constantes na produção de Pantera Negra. A realidade destes dois atores é tão forte que pode atrapalhar a imersão de quem está mais antenado na gravidade do mundo real.

    Apesar de contar com estrelas de grande calibre como Russell BrandJennifer Saunders e Dawn French, a equipe parece fora de sintonia - característica que não faltou em Assassinato no Expresso do Oriente, mesmo com a recepção ruim do público e da crítica. No elenco da adaptação de 2017, tínhamos Judi Dench, Penélope Cruz, Willem Dafoe, entre outros astros, cujo carisma inquestionável acrescentava mais autenticidade a personagens que, naturalmente, não têm tempo para ser aprofundados e nem oferecer muitas explicações. 

    Em todos os outros aspectos, Morte no Nilo provavelmente leva a melhor no “Poirot-verso” com cenas mais bonitas e vibrantes e provocando um clima de tensão menos caricato, mas que tem seus momentos de humor. Kenneth certamente trouxe sua experiência de Assassinato no Expresso do Oriente e parece ter encontrado uma forma mais confortável de conduzir a adaptação.

    Vale a pena assistir Morte no Nilo?

    A estreia de Morte no Nilo foi marcada originalmente para dezembro de 2019 e, de fato, a principal sensação é de que o filme deveria ter sido lançado alguns anos antes. O adiamento pode ter prejudicado o conjunto da obra: além da pandemia, claro, esse meio tempo tornou Armie Hammer uma figura muito negativa e permitiu que Entre Facas e Segredos saísse na frente: o longa de Rian Johnson, sem dúvidas, estabeleceu um novo padrão para filmes do gênero, homenageando Agatha Christie a todo momento, mesmo não sendo uma das muitas adaptações da obra dela.

    Como ressaltamos no início, a fórmula do assassino misterioso é praticamente infalível, não importa muito como seja aplicada. Nesse sentido, Morte no Nilo faz bom uso dos clichês e do mistério para a simplicidade a que se propõe. Provavelmente, não é dele que você vai se lembrar quando alguém pedir uma boa recomendação de filme de mistério, mas também não há frustração. Não é à toa que Poirot se tornou um dos personagens mais clássicos da ficção: todo mundo ama um bom detetive e dificilmente vai querer tirar os olhos da tela antes de descobrir, enfim, quem matou. 

     

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