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    Casa da Xiclet
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    Casa da Xiclet

    A arte como estilo de vida

    por Bruno Carmelo

    Uma placa indicando a rua Fradique Coutinho, em São Paulo. Uma imagem da fachada, com os dizeres Casa da Xiclet e o símbolo remetendo à goma de mascar. Um passo a mais e entramos numa galeria incomum, a casa da própria Xiclet, que aceita exibir obras nas suas paredes sem curadoria. A casa torna-se espaço público e privado: qualquer um pode entrar, conversar, admirar os trabalhos, comprá-los se e mesmo dormir no local se tiverem vontade. A proprietária rejeita as figuras institucionalizadas dos galeristas, críticos, mecenas. Para ela, a arte deve ser vivida na prática cotidiana e comunitária.

    O documentário é beneficiado pela figura ímpar de Xiclet, uma mulher extrovertida, engraçada e muito complexa pela postura política, mas não partidária. Ela combina a admiração pela arte reconhecida historicamente (a paixão pelos trabalhos de Nelson Leirner) e a vocação democrática de apoiar novos artistas sem um local para produzir ou expor suas obras. A protagonista soa ao mesmo tempo controladora e permissiva, apaixonada pelas obras de arte mas também distanciada das mesmas, por vê-las todos os dias na parede de sua casa. A diretora Sofia Amaral capta muito bem estas contradições, em depoimentos valorizados pela espontaneidade.

    É uma pena, no entanto, que o projeto não consiga se aprofundar na vivência da casa. As pessoas falam sobre a experiência cotidiana nesta galeria atípica, mas a câmera nunca toma o tempo de acordar no local, passear pelos cômodos, ver as pessoas produzindo ou expondo, em silêncio, sem intervir. As imagens já vêm significadas, comentadas, sem que o espectador tenha a oportunidade de enxergar o local com seus próprios olhos e compor uma interpretação pessoal. A direção nos diz exatamente o que pensar e saber sobre aquele espaço, situando o espectador numa posição passiva demais.

    Além disso, o filme sofre com problemas técnicos, seja o trabalho deficiente de som, um tanto estourado em alguns depoimentos, ou mesmo a luz esbranquiçada da entrevista com Nelson Leirner, por exemplo. Às vezes, a aparência de amadorismo e urgência combina com a liberdade da biografada. Em outros casos, a transição musical entre as cenas e a apresentação estereotipada de certos espaços (o Rio de Janeiro, visto pela milésima vez com flashes das praias e do Cristo Redentor) demonstram uma preocupação insuficiente com a condução da narrativa, ou mesmo a busca por uma identidade própria.

    Casa da Xiclet flerta constantemente com o vídeo institucional, enquanto os comentários, especialmente na primeira metade, limitam-se aos elogios da galerista e sua gestão. Mesmo assim, pela leveza e pela maneira de retratar a vida de artista sem idealizações, o filme consegue comunicar ao espectador ideias para além de seu objeto de estudo.

    Filme visto no 25º Festival Mix Brasil, em novembro de 2017.

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