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    Querida Mamãe
    Críticas AdoroCinema
    1,5
    Ruim
    Querida Mamãe

    Jogo de agressões

    por Francisco Russo

    Foram 11 anos de espera até que a peça teatral "Querida Mamãe", escrita por Maria Adelaide Amaral, enfim chegasse às telas de cinema. O tempo de espera, entretanto, não fez mal ao texto: os temas da incomunicabilidade e do preconceito estão mais vivos do que nunca, como se pode conferir em rápidas visitas às redes sociais. Apesar disto, o agora filme Querida Mamãe naufraga clamorosamente, muito graças aos muitos problemas técnicos e de condução da narrativa.

    O mais flagrante deles é a edição, completamente equivocada e brusca, que chega ao ponto de cortar palavras pela metade, antes mesmo que elas terminem de ser ditas pelo elenco. A trilha sonora, bastante carregada de forma a elevar artificialmente a tensão, rapidamente torna-se incômoda, por mais que até combine com o tom exagerado existente em muitos personagens. O melhor exemplo - mas não único! - é Marat Descartes, bom ator que aqui surge desnecessariamente histérico em todas as cenas.

    A bem da verdade, boa parte destes problemas deve ser creditada na conta do diretor Jeremias Moreira Filho, pela adoção de um jogo de agressões entre todos os personagens que inclui, além de palavras duras, diversos excessos no tom buscado junto ao elenco. Se o texto de Maria Adelaide já oferece material mais do que suficiente para embasar os problemas familiares existentes, a decisão em não apenas se basear na malícia do rancor guardado por anos para, também, transmitir tal raiva a partir de explosões faz com que o filme, em diversos momentos, se transforme em um imenso barraco, similar aos vistos no programa televisivo Casos de Família. A verdadeira mensagem do texto apenas consegue enfim chegar ao público na metade final, justamente quando o tom histérico é amenizado.

    Ainda assim, tal proposta conceitual rende situações bastante problemáticas. A maior delas talvez seja o relacionamento odioso entre Heloísa (Letícia Sabatella) e a empregada de sua mãe, repleto de ofensas e provocações que revela também um flagrante preconceito sócio-econômico, no sentido de que o patrão tudo pode falar (e ofender) sob a aceitação tácita do subalterno. O mais incrível é que tal postura é um mero anexo à trama principal, sendo que a personagem da empregada poderia até mesmo ser retirada do roteiro. Ou seja, a inclusão de tal atrito tem por objetivo fortalecer ainda mais o clima de briga constante entre todos os personagens, sem pensar nas consequências que tal representação teria além do conflito em si.

    Em meio a tantos problemas, o que mantém algum interesse em Querida Mamãe é justamente o texto e alguns momentos de Letícia Sabatella, especialmente quando se entrega à possibilidade de ser feliz em um novo relacionamento. É quando escancara a repressão à homossexualidade que o filme ganha algum norte, por mais que mesmo estes momentos sofram constantes recaídas decorrentes da tentação onipresente pelo barraco. Mesmo Selma Egrei se rende à caricatura da rudeza de sua personagem, sem conseguir ir além do estereótipo da mãe que não consegue se comunicar com a própria filha.

    Filme visto na 41ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2017.

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