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    De Repente uma Família
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    De Repente uma Família

    Um filme de aconchego

    por Renato Furtado

    Tudo foi preparado cuidadosamente, dos pratos às bebidas e ao clima em si da noite de festa: Pete (Mark Wahlberg) e Ellie (Rose Byrne) querem oferecer o melhor jantar possível para seus três novos filhos. Mas em um piscar de olhos, Juan (Gustavo Quiroz) já está chorando novamente e sem motivo, Lizzy (Isabela Moner) está confortável vendo o circo pegar fogo e a pequena Lita (Julianna Gamiz) prepara-se para soltar seu potente grito. Tudo isso enquanto a toalha de mesa pega fogo e um vidro de ketchup é improvisado como extintor.

    Esta é apenas uma das muitas sequências de puro caos que marca a trama do fofo, aconchegante e bem-intencionado De Repente uma Família, inesperada incursão do diretor e roteirista Sean Anders (Pai em Dose Dupla) no território das dramédias. E ao passo em que o humor extraído das situações familiares é uma constante na recente filmografia do cineasta, Instant Family (título original) se diferencia de comédias mais ousadas como Este é o Meu GarotoQuero Matar Meu Chefe 2 por um motivo importante: esta é uma adaptação livre das experiências do próprio Anders com os sabores e desventuras acarretados pelo processo de adoção nos Estados Unidos.

    É importante ressaltar a conexão deste filme com a realidade porque fica claro que este projeto tem uma missão: declarar que toda família, independentemente de sua constituição, é uma família. Pais gays; mães solteiras que desejam seguir os passos de Leigh Anne, a premiada personagem de Sandra Bullock em Um Sonho Possível; adolescentes que são preteridos por causa de sua idade avançada; e um trio de crianças latinas que acaba indo parar sob os cuidados de um casal que jamais quis ter filhos: em De Repente uma Família há espaço e compreensão para todos.

    Mas, felizmente, nem tudo se resume à mensagem. Não é interesse dos realizadores apenas transmitir uma ideia, mas fazer rir e emocionar sem muletas narrativas — como uma trilha sonora invasiva demais ou cenas feitas para chorar, caso de muitos melodramas — para além da moral da história. Assim, ao mesmo tempo em que há uma narrativa dura por trás da condição de “órfãos” de Lizzy e de seus irmãos, as assistentes sociais de Octavia SpencerTig Notaro — que guiam Pete e Ellie pelo processo de adoção — e as loucas avós interpretadas por Julie HagertyMargo Martindale cuidam da tarefa de manter o alívio cômico com os pés no chão.

    A naturalidade da empreitada como um todo, aliás, é muito bem-vinda. Para um título hollywoodiano deste gênero, com estrelas como Wahlberg e Byrne, presentes em franquias enormes como Transformers e X-Men, De Repente uma Família consegue evocar a vibe de comédias dramáticas independentes, produzidas fora do sistema de estúdios. Evitando o riso fácil e arrancando suspiros — a sequência em que Pete é chamado de "pai" antes de Ellie ser reconhecida como "mãe" pelas crianças é verdadeiramente divertida —, o longa de Anders transita por territórios complicados e delicados — questões como abandono e paternidade — com a mesma facilidade com que apresenta momentos calorosos e genuinamente verdadeiros — cortesia, acima de tudo, da ótima química construída por Wahlberg e Byrne.

    Instant Family pode não traduzir por completo toda a complexidade dos meandros da adoção e ter um conflito final, bastante intrincado, resolvido de forma muito simples, com um "passe de mágica". Mas por outro lado, dentro do horizonte estabelecido por Anders nesta comédia dramática que jamais descamba para a zona do pastelão, este longa com certeza é um sucesso, gerando empatia por personagens que se encontram em um contexto de extrema imprevisibilidade, tentando derrubar barreiras e preconceitos para construir um núcleo sólido. E este é um agridoce desafio que todas as famílias, independente de suas formações, podem compreender.

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