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    Spielberg
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Spielberg

    Todas as virtudes de Steven

    por Bruno Carmelo

    Depois de Woody AllenBrian de Palma e David Lynch, chegou a vez de Steven Spielberg ganhar um documentário-homenagem. Por um lado, a proximidade do diretor com a cineasta Susan Lacy garantiu depoimentos emocionados do próprio Spielberg e um comentário detalhado dos principais filmes da carreira, além de entrevistas com alguns dos maiores nomes da indústria americana: George Lucas, Martin Scorsese, Francis Ford Coppola, Kathleen Kennedy, John Williams, Tom HanksLeonardo DiCaprio etc.

    Por outro lado, o filme evita comentários não elogiosos. O intuito do projeto é provar a genialidade do diretor, desencadeando um festival de cumprimentos mútuos, com os técnicos e atores exaltando Spielberg enquanto Spielberg exalta os seus colaboradores. Os fracassos do diretor mal são citados (O Bom Gigante Amigo, Cavalo de Guerra, As Aventuras de Tintim), e nenhum contexto histórico é utilizado para justificar o modo do cineasta filmar. Spielberg é a única medida de sua própria qualidade: para compreender porque ele fez cada um de seus filmes, Lacy busca elementos na infância, na criação dos pais. Eventuais críticas são atribuídas a terceiros, convenientemente ausentes do painel de entrevistados, e portanto incapazes de defender seus pontos de vista. Paralelamente, na intenção de sustentar a ideia de autor, Spielberg é lembrado somente pela função de cineasta, não como produtor de obras alheias (os menos prestigiosos Transformers e Cowboys & Aliens, por exemplo).

    O foco do projeto é ressaltar todas as qualidades que fazem de Spielberg “o artista judeu mais famoso do mundo”, ou “o diretor mais conhecido em todos os tempos”, segundo os entrevistados. Algumas dessas qualidades, de acordo com Lacy, são: 1. Vocação: ele teria nascido para filmar, com um talento inato desde criança, tornando-se cineasta quase por necessidade; 2. Cinefilia: ele assistiu e ainda assiste a uma quantidade expressiva de filmes, e revê com frequência para extrair o melhor de cada um; 3. Talento forjado na adversidade: ele só filmaria tão bem por ter sofrido bullying na infância e ter atravessado o difícil divórcio dos pais, que o levou a retratar tão bem a família; 4. Precocidade: foi o mais jovem diretor a conseguir um contrato de sete anos com os estúdios Universal, 5. Pioneirismo: criou o blockbuster com Tubarão, desenvolveu efeitos jamais vistos em Contatos Imediatos de Terceiro Grau, deu o primeiro passo na tecnologia digital com Jurassic Park; 6. Inovação: usou ângulos e objetivas que ninguém usava, criando uma dinâmica de cenas inédita até então; 7. Tino comercial: focado na indústria, visando agradar o público tanto quanto os produtores e acionários dos estúdios; 8. Pluralismo: cria vários projetos em paralelo, além de abrir restaurantes e gerenciar marcas relacionadas a suas franquias; 9. Patriotismo: ele assume ser um idealista que “acredita nos Estados Unidos”.

    Spielberg fornece diversos elementos para comprovar cada um desses itens. A diretora pretende mostrar, como cabe ao gosto americano, a história de um vencedor, de um garoto tímido que deu a volta por cima e construiu um império. Ironicamente, para ressaltar o caráter arrojado e inovador do criador de E.T., ela opta pelo formato mais convencional possível, alternando depoimentos e imagens de arquivo, numa linearidade previsível, sem adotar um caminho narrativo específico para além da historicidade dos fatos. Este é, acima de tudo, um estudo que parte de uma hipótese pronta (“Spielberg é um gênio”), selecionando nas imagens apenas os indícios que comprovem sua teoria.

    Pelo didatismo e fartura de informações, o documentário deve agradar a cinéfilos, ainda que não traga elementos realmente novos sobre o diretor. Mais do que um panorama histórico de Steven Spielberg, o filme vale pelo retrato subjacente do que significa o sucesso à americana, do que importa para se destacar na competitiva indústria de Hollywood. Lacy reforça a noção de conquista artística ligada à conquista comercial: Steven Spielberg foi o primeiro cineasta a atingir US$1 bilhão com seus filmes porque é muito bom, e Steven Spielberg é muito bom porque foi o primeiro cineasta a atingir US$1 bilhão com seus filmes.

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