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    Cuba Jazz
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    Cuba Jazz

    Na superfície da identidade cultural

    por Bruno Carmelo

    O documentário dirigido por Max Alvim e Mauro di Deus gira em torno de questionamentos fundamentais: qual é a essência da cultura cubana? O que torna a música local diferente de todas as outras? De que maneira seus artistas construíram uma especificidade no cenário internacional? As perguntas ganham uma relevância particular dentro de um país em transformação. É uma pena, no entanto, que o projeto não encontre respostas satisfatórias a nenhuma delas.

    Cuba Jazz é um documentário de constatação e consenso. Ele se prende à radiografia de uma situação: adotando a estrutura clássica dos talking heads, os diretores permitem que os entrevistados descrevam a sensação de especificidade cubana no ritmo, na maneira de se portar e de ver o mundo. Entre “jazz cubano” e “jazz latino-americano”, todos concordam que a primeira alternativa é a única possível para descrever a rica produção musical da ilha. Dizem que os estilos de outros países foram ressignificados no país, e que os gêneros tipicamente cubanos se espalharam com uma velocidade espantosa.

    A montagem busca nas dezenas de entrevistas frases capazes de reforçar um discurso único: quando alguém sugere que a educação musical no país seria eurocêntrica, uma fala a seguir repete o mesmo termo. Quando um músico discorre sobre o termo “jazz cubano”, outros três falam praticamente a mesma coisa. Mesmo temas controversos, como o impacto do embargo econômico na produção cultural cubana, tornam-se curiosamente unívocos: todos insistem que a abertura pós-Fidel é positiva, indispensável, e que o isolamento político trouxe apenas dificuldades. Alvim e Di Deus evitam o discurso dialético, insistindo em uma única percepção, frase após frase.

    Mas por que o estilo cubano é tão diferente do resto do mundo? De que modo se percebe esta diferença? Como ele reflete a história, a sociedade, a política nacional? É na reflexão que o projeto empaca. Alguns entrevistados, com um discurso interessantíssimo, são tolhidos pela edição: uma musicóloga, por exemplo, sugere que o tráfico de escravos teria sido essencial à construção do ritmo cubano. É uma tese impactante, mas não desenvolvida: uma vez enunciada a frase, a edição retira a entrevistada de cena, substituindo-a por uma montagem impessoal, quase turística, de pessoas dançando nas ruas de Havana. As cenas são cortadas sempre que os entrevistados estão prestes a aprofundar ideias.

    Esteticamente, Cuba Jazz sofre com a indecisão imagética e com a falta de ambição plástica. Os inúmeros depoimentos possuem uma captação de som e luz muito diferentes entre si, formando um conjunto caótico. Os poucos interlúdios musicais são preenchidos por imagens pouco inspiradas, repetidas, filmadas do mesmo ângulo, como a apresentação de uma baterista em preto e branco. Aqui e acolá aparecem ideias imagéticas interessantes: crianças jogando futebol dentro de uma piscina vazia, ou uma cantora conversando com os diretores enquanto caminha pela cidade. São momentos poéticos que dizem muito mais sobre a identidade cultural do que os depoimentos contra uma parede branca desfocada, ou com a equipe refletida nos óculos espelhados dos músicos.

    É apenas na reta final que o documentário decide correr atrás de alguma proposta de interação com o meio, fazendo com que seus músicos convirjam numa jam session. A lógica do improviso e da sociabilidade tipicamente cubana se resume nesta cena que, infelizmente, dura menos de cinco minutos. Além disso, a montagem sonora, para um filme sobre música, revela-se quadrada e deficiente. De resto, o discurso se limita à percepção de que Cuba tem algo especial, único, um fervor e um ritmo que não se encontram em nenhum outro lugar. Parece ser verdade, e provavelmente é. Mas o filme não consegue mostrar o porquê.

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