Nostalgia banal
por Kalel AdolfoUnindo o sobrenatural ao slasher, Rua do Medo 1994 — dirigido por Leigh Janiak — é uma atrapalhada carta de amor ao cinema de horror. A trama — adaptada dos contos de R.L. Stine — flerta com inúmeras convenções do gênero, buscando incessantemente recriar a atmosfera hipnotizante de clássicos da época como Pânico e Ringu. Infelizmente, a ambiciosa empreitada possui pouca substância narrativa, e se transforma rapidamente em um festival de referências cinematográficas artificiais.
Na trama, um grupo de jovens investiga uma série de homicídios que aparentam estar conectados. Porém, o envolvimento neste mistério faz com que eles se tornem os próximos alvos do assassino. Kiana Madeira (Flash), Olivia Scott Welch (Panic), Benjamin Flores Jr (Policial em Apuros) e Maya Hawke (Stranger Things) são alguns dos nomes presentes no elenco.
Proposta objetiva é mal-aproveitada
Apesar da proposta objetiva, Rua do Medo perde o potencial de cativar os espectadores ao acrescentar novos elementos à história em uma frequência exaustiva. Portanto, o que deveria ser um capítulo de introdução ao universo criado por Janiak acaba se transformando em um emaranhado de ideias mal executadas que nos desconecta da experiência.
O roteiro só encontra fôlego quando desenvolve o mistério central da trama, ao invés de tentar aprofundar assuntos secundários. Essa é uma grande oportunidade perdida, já que a produção definitivamente entretém nos momentos em que não se leva tão a sério.
Rua do Medo não possui uma identidade definida
O início da trilogia peca excessivamente quando o assunto é originalidade. Há inúmeras formas de homenagear obras clássicas sem abrir mão de uma identidade ímpar. Alguns títulos como Terror nos Bastidores (2015) e The Babysitter (2017) são ótimos exemplos disso.
Mas o que vemos em Rua do Medo é bem diferente: ao invés de inovar através da metalinguagem, o longa recorre à saturada fórmula da nostalgia banal que vem dominando Hollywood nos últimos anos.
A influência do trabalho de Stephen King também é evidente no filme. Mas enquanto as obras do autor estão carregadas de emoção e fantasia, a produção da Netflix é dominada por uma energia monótona.
Personagens apáticos nos afastam ainda mais da história
Não é novidade: personagens apáticos são um grande veneno para as tramas de terror. E aqui, o elenco é desperdiçado através de papéis robotizados, que mantém os indivíduos em uma linha de comportamentos repetitivos.
A falta de motivações — acoplada a um pobre desenvolvimento de personagens — faz com que o longa perca a sua carga amedrontadora, já que não nos importamos com o que acontecerá com os indivíduos retratados na história.
Outro grande fator para o distanciamento da experiência é o ritmo da obra, que é apressado em momentos importantes, e arrastado em situações triviais.
Rua do Medo é bem-sucedido como terror?
Além de ser emocionalmente defasado, Rua do Medo não consegue manipular os clichês do gênero a seu favor. Os famigerados jumpscares não marcam presença na produção, e o senso de tensão é inexistente durante as quase duas horas de duração.
O apelo gore — que acabou rendendo uma classificação indicativa alta para o filme — é um dos poucos elementos que pode chocar o público. Mesmo assim, a ausência de efeitos práticos acaba reduzindo a credibilidade das sequências mais sangrentas.
Um dos poucos pontos positivos do longa é o romance entre Deena e Samantha. Ter um casal queer protagonizando uma obra de terror mainstream da Netflix é revitalizante tanto para o gênero quanto para o serviço de streaming. Além disso, a divisão entre Sunnyside e Shadyside é bem explorada, dando espaço para interpretações sociais que agregam valor ao filme.
Contudo, o primeiro capítulo da trilogia não empolga tanto quanto o seu ambicioso plano de lançamento. Sem vida, a obra falha em resgatar o espírito da época que tenta retratar, entregando performances mornas e um resultado esquecível.