Certamente já assistimos vários filmes sobre a mesma temática, alguns até muito melhores e mais envolventes do que este, como por exemplo ‘They/Them - O Acampamento’, de 2022, dirigido por John Logan, roteirista de ‘Gladiador’, ‘O Aviador’ e ‘007 - Operação Skyfall’ e protagonizado por Kevin Bacon.
O diferencial está exatamente no fato de que, por ser infinitamente mais sutil e menos explícita, a violência cotidiana, em relação aos LGBTQIA+ que "precisam" ser submetidos a esta "terapia", parece bastante mais factível e mais real.
Excetuando a "surra de Bíblia" aplicada ao personagem Cameron, única vítima fatal deste filme (que se suicida, por não aguentar a pressão),
a violência é muito mais "simbólica", mais verbal e psicológica, menos física, do que no filme de John Logan. Naquele caso, até porque todo o contexto é muito mais truculento, nos é oferecido um desfecho libertador, no sentido de que existe a vingança, a revanche, de todos aqueles que foram agredidos e silenciados.
Focado na obsessão de uma sociedade doente, construída em grande parte sobre o Fundamentalismo, que não tolera "desvios", o discurso de 'Boy Erased' é religioso, da primeira à última cena. Se houvesse um único personagem não cristão em cena, toda a construção do filme desmoronaria, como um castelo de cartas quando uma delas é retirada. O enredo não se sustenta sem a premissa de que tanto os que atuam quanto os que assistem são cristãos.
Um dos motores que impulsionam o enredo, que é o conflito entre o filho gay universitário e o pai pastor, não foi bem construído. Parece absolutamente superficial e desnecessário, já que o filho é maior de idade, logo, tem todas as condições, inclusive legais, de tomar as próprias decisões.
Inclusive, diante deste fato (a maioridade) parece absurdo precisar haver uma intervenção da mãe (mais uma grande atuação de Nicole Kidman), no sentido de ir retirá-lo da terapia, onde ele é mantido quase que em cárcere privado.
Ao final do filme, baseado em fatos reais, nos é revelado por um narrador, que este tipo de "terapia" ainda existe em 36 Estados dos EUA e que aproximadamente 700.000 pessoas já foram submetidas a esta experiência.
Definitivamente, é mais um terror do que um drama. Demonstra a miopia intelectual de grande parte de uma nação que, paradoxalmente, se diz cristã, embora dê muito mais ênfase ao Levítico (Antigo Testamento) do que aos Evangelhos, ao amor, à aceitação e ao perdão, que são a tônica da doutrina deixada por Jesus.