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    Os Fabelmans
    Críticas AdoroCinema
    4,5
    Ótimo
    Os Fabelmans

    Steven Spielberg mora nos detalhes

    por Aline Pereira

    Lá pela metade de Os Fabelmans, há uma cena em que o protagonista, Sammy (Gabriel LaBelle), encosta suavemente a cabeça em sua câmera de vídeo e o som do rolo de filme rodando é a única coisa capaz de abafar o ruído incômodo da realidade. Este é só um dos grandes momentos do filme de Steven Spielberg que reforçam sua genialidade no trabalho que se propõe a fazer – em uma obra que talvez seja a mais íntima de toda a sua carreira, o cineasta nos leva por um olhar sensível que faz entender por que é um dos maiores artistas de nosso tempo. 

    Com inspiração da vida do próprio Steven Spielberg e de sua família, Os Fabelmans acompanha o amadurecimento de Sammy, cuja infância é marcada pela descoberta do cinema: quando seus pais o levam para assistir a O Maior Espetáculo da Terra, filme de 1952, nosso protagonista fica fascinado pela grandiosidade da ficção e encontra – na própria imaginação e nas câmeras – não só uma paixão arrebatadora, mas um propósito e um refúgio.

    Sammy vive com as irmãs (com quem divide momentos ternos e hilários na fabricação de seus filmes) e com os pais, cuja relação e o desenrolar do casamento também o impacta profundamente. O pai, Burt (Paul Dano) é um engenheiro de computação e a mãe, a pianista Mitzi (Michelle Williams), enfrenta alguns dilemas e transtornos que acabam desencadeando os conflitos entre o casal. É com esta dinâmica que Sam passa da infância à adolescência e juventude encontrando a própria voz, aprimorando sua arte e equilibrando pratos emocionais.

     

    Universal Studios

    Os Fabelmans é a marca do olhar único e inconfundível de Steven Spielberg 

    Lançados pouco antes de Os Febelmans, títulos como o indicado ao Oscar Belfast (2021) e Armageddon Time (2022) também trazem a combinação entre semi-biografia e homenagem à arte, mas a obra de Steven Spielberg estica essa premissa e a leva um passo além no que diz respeito à sensibilidade. Não há dúvidas de que o diretor de Jurassic Park - Parque dos DinossaurosE.T. - O Extraterrestre é um mestre na habilidade de traduzir em imagens as nuances humanas. Todas elas, não importa em que escala. Em seu filme de 2023, essa marca fica ainda mais clara. 

    Em Os Febelmans, não há acontecimentos estratosféricos – e não fazem falta porque, aqui, a vida comum é extraordinária. É impossível passar ileso pelas emoções de Sammy e, mais do que isso, talvez, por suas paixões. E se o contexto geral daqueles personagens não causam identificação direta ou imediata, a lupa que o cineasta coloca sobre os sentimentos que eles carregam, mostram o que há de mais universal entre nós. 

    É neste quesito que o longa se distancia dos outros dois mais recentes citados acima: a cada vez em que Spielberg nos coloca dentro do olhar de seus protagonistas (quase que literalmente, às vezes), alguma informação tão pessoal vêm à tona que fica irresistível o convite para também nos encontrarmos dentro desses momentos. A história de Os Fabelmans se sustenta tão genuinamente nas sutilezas que é como se o contexto geral ficasse em segundo plano: não importa muito o quanto a realidade do público esteja distante da história contada, as emoções são reais. Muito, mesmo. 

    Universal Studios

    Mais uma carta de amor ao cinema 

    Basta uma olhada na lista de premiações, em qualquer ano, para identificar a presença carimbada de filmes que fazem homenagem à sua própria indústria. Não à toa, Os Fabelmans também apareceu entre os grandes destaques de sua temporada: é um dos maiores cineastas da história nos contando como tudo começou – interessante por si só e vale destacar que quem já é fã dos trabalhos de Steven Spielberg, sem dúvidas, sairá de Os Fabelmans não só mais encantado, mas também entendendo melhor a mente do diretor. 

    Entre as produções que trabalham essa mesma temática é, mais uma vez, a sensibilidade única de Spielberg que a torna uma das melhores já produzidas. A relação entre o protagonista e o cinema é profundamente íntima, genuína, dolorosa em alguns momentos, mas muito feliz em outros. O poder da imagem, do som, da narrativa transformam a vida de Sammy de forma definitiva e implacável e tem potencial para fazer o mesmo com quem está assistindo, porque o cineasta encontra os pontos onde a realidade precisa ser extrapolada no drama, no humor, na tensão e a já conhecida excelência técnica (cujas raízes estão no filme!) deixam o espectador sempre no equilíbrio, sem dificuldade alguma. 

    Os Fabelmans tem elenco impressionante 

    Para trabalhar tanto as emoções, é claro, o elenco adequado é indispensável. Mais um ponto fortíssimo de Fabelmans que traz, em especial, Michelle Williams em um de seus melhores papéis. Como mãe de Sammy, a atriz de Sete Dias Com Marilyn tinha na mãos uma lista complexa de características para retratar e, mais do que isso, para fazer funcionar na dinâmica com seus co-protagonistas. Os acontecimentos entre Mitzi e o filho são o principal fio condutor da história: fica a sensação de que Spielberg conseguiu olhar para o próprio passado e para os indivíduos de sua família mais com ternura do que com algum tipo de ressentimento - um trabalho também apoiado na ternura de seus atores. 

    Universal Studios

    Paul Dano, no papel do pai racional, forma uma dupla afinadíssima com o caos da personagem de Michelle Williams e essa equação também nos ajuda a entender Sammy. O lado pragmático e o artístico não são rivais aqui e, ao contrário, são formações igualmente importantes - há de se ter um pouco das duas coisas para que ideias brilhantes possam ser executadas na prática e é uma diversão acompanhar essa jornada.

    “Filmes são sonhos que você nunca esquece”, diz Mitzi em uma das cenas e, de fato, toda a montagem de Os Fabelmans parece um sonho, das escolhas visuais à trilha sonora fantástica assinada por John Williams, um dos maiores colaboradres de Spielberg responsável por alguns dos sons mais emblemáticos do cinema (de Tubarão a Harry Potter). Não haveria, aliás, escolha melhor para acompanhar esse mundo de “sonho”, de nostalgia e nos relembrar – porque sempre é preciso – que boas histórias são realmente muito poderosas.

     

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