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    Monos - Entre o Céu e o Inferno
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    Monos - Entre o Céu e o Inferno

    O exército sem inimigos

    por Bruno Carmelo

    Se este fosse um projeto de Hollywood, nós logo descobriríamos o que fazem os oito adolescentes sobre o topo de uma colina isolada. Para qual guerra eles se preparam tanto, noite e dia? Quem os recrutou, em nome de que ideologia pretendem lutar? O que está acontecendo com a sociedade ao redor? Estes jovens têm famílias, amigos? Vêm da cidade? De que modo foi sequestrada a Doutora (Julianne Nicholson), e quais foram as exigências do resgate? No entanto, nenhuma dessas informações é respondida pelo diretor Alejandro Landes.

    É possível supor que tudo não passa de uma brincadeira, um jogo performático de amigos em férias, até a presença de armas de fogo e bombas distantes garantir que o perigo é real. Ora, um dos elementos mais importantes das distopias é a descrição deste novo mundo, suas regras sociais e políticas, além das implicações psicológicas – basta pensar em Jogos Vorazes e The Handmaid’s Tale, para utilizar dois exemplos comerciais recentes. No entanto, Monos se inicia quando esta nova configuração está muito clara aos personagens, não precisando ser explicada. Como enxergamos o mundo através dos olhos deles, não receberemos uma informação que se tornou senso comum aos participantes da jovem milícia.

    Deste modo, estamos falando de um suspense sem a intenção de se desvendar – os personagens sempre saberão muito mais que o espectador -, e um drama que oculta informações indispensáveis para que o público possa torcer pelos jovens e temer por suas vidas. Somos convidados a testemunhar uma situação grave sem compreendê-la, sem participar do jogo. O filme não parece feito para nós, e sim apesar de nós. O olhar do espectador se converte em intruso e voyeur: estamos espiando um grupo que não deseja ser visto, testemunhando cenas (a morte da vaca, o acidente com a pistola) que deveriam ser escondidas.

    Devido à relação hermética com esta trama fantasma, nos resta admirar a beleza dos planos. Talvez resida neste aspecto o verdadeiro interesse do jovem cineasta colombiano-equatoriano. Monos se converte numa espécie de portfólio ao autor, uma possibilidade de demonstrar a sua destreza com a criação de planos difíceis e impressionantes – vide a presença das crianças na correnteza, em plano-sequência, o resgate numa casa da região e a tentativa de fuga da Doutora. Os planos são fluidos, bem enquadrados e iluminados, especialmente nas sequências de treinamento dos jovens soldados. Existe um domínio técnico invejável, exibido sem moderação durante as sequências de aventura. É uma pena, no entanto, que estes recursos chamem tanto a atenção a si mesmos, ao invés de servirem a um propósito narrativo.

    Não seria surpreendente se Landes fosse em breve convidado para produções maiores, mais caras e comerciais, em Hollywood, por exemplo. A indústria norte-americana sempre busca talentos jovens cujos conhecimentos cinematográficos possam ser empregados para transmitir as mensagens e narrativas desejadas pelos grandes estúdios. Este é o principal elemento ausente de Monos: um ponto de vista sobre aquela situação, sobre a vida dos jovens e sua prática militar. O que Landes deseja transmitir através desta fábula misteriosa? Que relações ela estabelece com a realidade? As interpretações possíveis são tão amplas que enfraquecem a obra como veículo de representação do mundo. Afinal, a distopia só adquire sentido quando comparada com uma realidade prévia.

    Filme visto no 69º Festival Internacional de Cinema de Berlim, em fevereiro de 2019.

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