Uma sensação de vazio
por Bruno CarmeloJi-hyeon (Woo Ji-hyeon) está deprimido e levemente bêbado. Ele telefona para um amigo que não vê há décadas, pergunta como conseguiu ter tanto sucesso, questiona se é feliz. O outro, surpreso, responde como pode. Ji-hyeon ri com ele, chora ao admitir que tinha esquecido o nome do amigo, e depois pede para este, conhecido pelos dotes vocais, cantar uma música. Reticente, ele o faz. Ji-hyeon fecha os olhos a aproveita a música romântica entoada a contragosto, unindo precariamente duas pessoas distantes.
Esta é a cena mais bela do drama sul-coreano Outono, Outono, de Woo-jin Jang. Ela sintetiza muito bem a proposta do filme: acompanhar pessoas comuns, entre a melancolia e a tristeza, tentando encontrar algum sentido em suas vidas. As imagens são simples, as atuações beiram o improviso, os diálogos privilegiam os silêncios e incômodos às frases repletas de significado. Os enquadramentos são fixos, longos, de modo a interferir o menos possível nos personagens e no cenário. O discurso revela-se igualmente minimalista: o cineasta não pretende traçar uma grande investigação sobre a solidão nas metrópoles, apontando causas nem consequências. Ele busca um pequeno fragmento de vida.
Outra dupla é retratada no filme: Se-rang (Lee Se-rang) e Heung-ju (Yang Heung-ju), dois adultos que se conheceram pela Internet e viajam juntos pela primeira vez. Ambos têm grande bagagem emocional – muitos amores e decepções – e não escondem o interesse mútuo. A perspectiva de romance é interrompida pela inabilidade de ambos no flerte, pela tendência a falarem demais de seus ex-namorados e pelo cenário nublado e pouco intimista de Chun-Cheon, destino turístico do país. O cineasta filma os momentos banais entre os conflitos, ou seja, os instantes que provavelmente seriam cortados na mesa de edição de um romance padrão. Como num curioso road movie estático, o que interessa é o caminho, não o destino.
É uma pena que tantas cenas belas e humanistas sejam temperadas por outras mais desajeitadas. O filme se abre com o momento mais frágil de todos, quando os três personagens principais sentam lado a lado dentro de um metrô, sem se conhecerem. A captação da imagem e do som vai além do simples, torna-se simplória, amadora. Quando Se-Rang e Heung-ju chegam a um hotel, a câmera inclina-se até a diagonal, num recurso que não se repete mais. Depois, ao observarem uma maratona na rua, o mundo é visto em câmera lenta. Trata-se de recursos destoantes da proposta geral, adotados de maneira tão pontual e acanhada que não permitem aprofundamento.
De modo geral, Woo-jin Jang apresenta certa dificuldade em definir seu estilo. A referência mais próxima para este tipo de cinema seriam os trabalhos de Hong Sang-soo, com suas pessoas falhas e comoventes abrindo o coração à mesa do jantar, bêbados. Em Outono, Outono, encontramos pessoas igualmente falhas em situações banais, porém a estética busca belezas artificiais – a luz do sol intermitente durante o almoço – que funcionam dentro de suas cenas, porém formam um conjunto desequilibrado. De qualquer modo, o retrato humano é carinhoso, realista, reforçando o cinema como pequena crônica do mundo.
Filme visto no 6º Olhar de Cinema - Festival Internacional de Curitiba, em junho de 2017.