O universo compartilhado de M. Night Shyamalan!
VIDRO (Glass
Vidro é o terceiro filme da trilogia iniciada por Shyamalan lá no início dos anos 2000. Pode até ser que Shyamalan tivesse realmente a intenção de criar uma trilogia a partir de "Corpo Fechado", ele até chegou a afirmar que o personagem Kevin (James McAvoy) foi escrito para o roteiro de Corpo Fechado, mas por problemas ele decidiu cortá-lo da história. Porém a Touchstone Pictures decidiu por não financiar o projeto na época, mesmo com a bilheteria estável de Corpo Fechado, o que levou o Shyamalan a decidir criar a sua trilogia só 16 anos depois, com "Fragmentado". Foi assim que Shyamalan decidiu inserir o personagem do Bruce Willis (David Dunn) na cena pós-créditos de Fragmentado, pra estabelecer uma narrativa dentro do universo de Corpo Fechado, e assim dar continuidade ao seu projeto de criar um universo para os seus super-heróis.
Em Corpo Fechado o Shyamalan trouxe um roteiro interessantíssimo sobre aquele submundo das HQ´s, a criação do herói e do vilão, um filme totalmente sombrio e uma pegada mais dark. Em Fragmentado ele já veio com o suspense e o drama vivido na pele de Kevin Wendell Crumb (McAvoy) e suas 23 personalidades distintas e todos os seus descobrimentos, o que na minha opinião funcionou e encaixou com perfeição. Faltava a ligação de Elijah Price, o Sr. Vidro (Samuel L. Jackson), com a figura de Kevin e novamente o seu encontro com David Dunn, pra finalmente fechar todo o universo e toda história de M. Night Shyamalan.
Em Vidro Shyamalan nos entrega mais um roteiro funcional (como já havia feito em Corpo Fechado e Fragmentado). O que de fato esperávamos aconteceu (ou mais ou menos), que foi a ligação/embate das três figuras e consequentemente o final das suas respectivas histórias. O cenário ideal para o Shyamalan dessa vez é o hospital psiquiátrico da Filadélfia, onde o longa se desenvolve praticamente 100% do seu tempo, nos apresentando a figura do Sr. Vidro aprisionado por mais de uma década. Dentro desse hospital o pano de fundo será o encontro de David, Kevin e Elijah com a Dra. Ellie Staple (Sarah Paulson), uma psiquiatra que acredita que tudo que eles vivem e sofrem não passam de um delírio, que realmente não exista super-humanos (a forma de super-heróis que Elijah acredita e quer provar que existe para toda humanidade).
Shyamalan tem um ótimo roteiro em mãos (funcional como já destaquei) e ele desenvolve bem em umas partes e mal em outras. Como o fato do encaixe das três histórias, passando pelos acontecimentos com David no acidente de trem (a ligação de Elijah que vimos em Corpo Fechado), com a ligação do passado de Kevin (uma parte fundamental pra história). Dessa forma a mente brilhante de Elijah propõe a união das figuras pra exibição dos seus reais poderes, um fato que ele sempre acreditou desde o início, o que é comprometido direto pela crença das pessoas e principalmente pela Dra. Staple, que mantém as suas convicções. Então se pararmos pra analisar, o roteiro que Shyamalan escreveu é formidável, tem propostas certeiras pra cada um dos personagens, principalmente com a ligação de ambos com Elijah.
Porém, Shyamalan peca no desenvolvimento dos personagens, que na minha opinião foram mal explorados. A Começar pelo Sr. Vidro (que teoricamente o filme seria sobre ele), que não apresenta aquela mesma ambição de Corpo Fechado, por mais que aqui a sua finalidade seja reunir e confrontar as duas figuras pra exibir para o mundo toda a sua crença, e foi o que ele realmente fez. Porém eu achei a sua história de um modo geral muito podada, muito corrida, ele poderia ser melhor utilizado, principalmente no primeiro e segundo ato. Já David Dunn é o mais mal utilizado de todo filme, principalmente no início e meio, que sequer teve um real objetivo (a não ser seguir a besta), se passou por marionete. David não chega nem próximo do que apresentou em Corpo fechado, aqui muito mal explorado, totalmente fora de foco, só pra compor a história mesmo.
Voltando na questão do mal desenvolvimento dos personagens: Casey Cooke (Anya Taylor-Joy) nesse filme é só pra compor o elenco trazido de Fragmentado, ela não tem um real propósito como tinha em Fragmentado, talvez ajudar a conscientizar o Kevin por meios das HQ´s que ela passou a pesquisar. Muito longe do protagonismo que ela dividiu com Kevin em Fragmentado. Joseph Dunn (Spencer Treat Clark) está aqui só pelo saudosismo mesmo, claramente sem uma finalidade objetiva. A não ser por sempre ter apoiado o super-herói do pai e sempre o ter incentivado nesse quesito (como não se lembrar do garotinho que guardava um imenso orgulho do pai ao final de Corpo Fechado). Na minha opinião, Shyamalan colocou a Casey, o Joseph e a mãe do Elijah só pra cada um ser representado do lado de fora do hospital.
James McAvoy mais uma vez rouba a cena e puxa todo o protagonismo e as atenções pra si (e olha que estamos no filme Glass). É realmente pra se aplaudir de pé a atuação de McAvoy em Vidro. Tudo que ele já havia apresentado em Fragmentado aqui está ainda melhor. Eu já havia ficado impressionado com a sua atuação em Fragmentado, com suas exibições das diferentes personalidades, mas em Vidro ele ainda vai além, sua atuação cresce e se eleva ainda mais. O modo como ele apresenta cada personalidade é ainda mais convincente e está ainda mais natural, ele sai de si e se transforma em cada uma com uma facilidade incrível e somente com o dom da sua atuação - é completamente SENSACIONAL! (por favor deem logo um Oscar para ele pelo conjunto da obra
Bruce Willis está ok, sua atuação como David Dunn está convincente como foi em Corpo Fechado. O problema é que ele não foi ajudado pelo roteiro, não teve o espaço necessário, dessa forma ele não brilhou como já havia brilhado anteriormente. Mas em questões de atuação Bruce Willis sempre foi um verdadeiro mestre!
Samuel L. Jackson é um showman à parte, sempre com atuações prazerosas e requintadas. Em Vidro não é diferente, Mr. Jackson consegue nos apresentar uma grande performance (talvez não no mesmo nível de Corpo Fechado), com aquele mesmo olhar sombrio e tenebroso, com aquela mesma expressão pitoresca. Como já destaquei, Elijah Price foi mal utilizado pelo roteiro, mas em atuação não tem como, Mr. Jackson sempre nos impressiona.
Eu adoro a Sarah Paulson, uma ótima atriz, em "12 Anos de Escravidão" ela me conquistou pelo seu talento, e de lá pra cá eu sempre a acompanho. Em Vidro ela é um achado do roteiro de Shyamalan, mas no que ele propõe ela se encaixa e funciona. A sua atuação é certeira para o papel de psiquiatra, suas falas, seus discursos conversam diretamente com o público que também defende a sua tese - esta é a mente brilhante de Shyamalan!
Anya Taylor-Joy é uma graça, uma atriz jovem, talentosa, linda, que já vem se destacando em alguns papéis e conquistando a atenção em Hollywood. Em Vidro ela reprisa a sua personagem de Fragmentado, dessa vez não com a mesma importância e um objetivo bem definido (como já mencionei antes). Mas até aonde o roteiro permiti ela ir, ela vai muito bem, entrega uma ótima atuação (como havia feito em Fragmentado).
Spencer Treat Clark é nostalgia pura, sua atuação é a mais mediana de todo elenco, mas realmente não tinha muito o que se esperar. Não por culpa do ator, mas seu personagem é mal inserido na trama, isso dificulta muito o desenvolvimento de uma boa atuação.
Com erros e acertos, M. Night Shyamalan conseguiu fechar bem a sua trilogia, conseguiu dar um destino para os seus super-heróis e todo o seu universo. O saldo final é bastante positivo, e podemos observar claramente que o Shyamalan voltou de uma vez para os seus tempos áureos. Agora é torcer para que ele se mantenha nesse patamar e não caia novamente no marasmo. [12/06/2019]