Sufragistas suíças
por Francisco RussoNos últimos anos, foram publicadas diversas denúncias e estudos que comprovam o quão prejudicadas são as mulheres dentro do mercado cinematográfico - não só em Hollywood, mas em todo mundo. Como reação, várias iniciativas surgiram no sentido não só de dar oportunidades a elas mas, também, contar suas histórias. O suíço Mulheres Divinas, candidato do país ao Oscar de melhor filme estrangeiro, atende a ambos os interesses, da forma mais preguiçosa possível.
Dirigido e roteirizado por Petra Biondina Volpe, o longa-metragem praticamente repete a história do britânico As Sufragistas, lançado em 2015: há poucas décadas atrás, as mulheres sequer tinham direito a voto e, para lutar pelos seus direitos, se unem para um protesto coletivo e coordenado - se os fatos variam de acordo com a história de cada país, a essência é a mesma. Tamanha semelhança, é claro, não se trata de um impeditivo, vide as inúmeras refilmagens que chegam ano sim e no outro também. O problema é que Mulheres Divinas capenga nos mesmos problemas narrativos de seu coirmão.
Senão, vejamos: por mais que traga uma importante história de valorização das mulheres, especialmente no sentido de igualdade em uma sociedade machista, Mulheres Divinas jamais quer, de fato, se aprofundar no tema. Nem mesmo é questionado o fato de na Suíça a proibição ao voto feminino ainda estar em vigor em 1971 - quase meio século após os eventos retratados em As Sufragistas -, insinuando que o analfabetismo político não só pertence às personagens mas também à própria direção. Tamanho desinteresse demonstra também uma apropriação indevida de tal história, no sentido de contá-la apenas parcialmente: aqui, o interesse é exaltar as mulheres, apenas isso. O resto é detalhe.
Diante disto, esqueçamos a trilha sonora canhestra que acompanha o longa-metragem. Esqueçamos a fragilidade do roteiro, especialmente em seu terceiro ato, quando a resolução surge de forma brusca. Esqueçamos o maniqueísmo das principais personagens, arquétipos típicos da mulher em uma sociedade interiorana. São detalhes que pouco importam a um tipico produto panfletário, que visa faturar em cima de boas intenções em torno do feminismo. O aplauso ao término da sessão não é ao filme, mas ao tema abordado. Simples assim.
Apesar disto, há algumas qualidades em Mulheres Divinas. A começar pelo bom trabalho de Marie Leuenberger como a protagonista Nora, assim como o figurino cuidadoso, que reflete as mudanças progressistas envolvendo a personagem. A viagem do trio principal a um país vizinho, onde descobre o próprio corpo em um curso, rende cenas divertidas que repercutem ao longo de todo o filme. Ainda assim, são apenas breves momentos onde se pode perceber tamanho apuro que vá além do burocrático em torno de uma tema importantíssimo, mais uma vez mal explorado na sétima arte.
Filme visto na 41ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2017.