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    Rei
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    Rei

    Brincadeira cinéfila

    por Bruno Carmelo

    Existe um humor curioso em Rey. O projeto dedica-se à fábula fictícia de um homem francês, no século XIX, que acredita ser predestinado a fundar um reino na região chilena da Araucania. O invasor monarquista chega ao local, conversa com os índios e torna-se escolhido por eles como novo líder. A trama absurda é ilustrada pelos delírios messiânicos do protagonista (interpretado por Rodrigo Lisboa), que tem poderes transformadores da água e se comunica com as forças da natureza.

    Durante o terço inicial da narrativa, as escolhas lúdicas do diretor Niles Atallah divertem bastante. Os efeitos especiais são analógicos, em tons simples, porém cuidadosos, remetendo a um universo infantil. Quando o protagonista é cercado por seres cobertos de palha, ou ainda quando é preso e interrogado por homens usando máscaras brutas – e ele mesmo passa a usar máscaras – o universo fabular se expande, busca novas imagens e formas de representação. O teor épico da viagem é substituído pelo relato paródico, que vê no folclore um meio potente de representação.

    Aos poucos, no entanto, a surpresa se dilui. Apresentados todos os truques, bichos e cenários fantásticos, o segundo ato de Rey se converte num longo flashback tradicional, tentando extrair humor dos costumes indígenas de modo não necessariamente muito respeitoso. As caricaturas exploram lugares comuns perigosos, incluindo o índio agressivo e o homem do campo bruto e traidor (Claudio Riveros). O humor permite evidente distanciamento desta posição, no entanto nenhuma outra postura é sugerida em seu lugar: a comicidade do projeto é autorreferente e inconsequente.

    No terço final, as brincadeiras folclóricas transformam-se em acenos cinéfilos. Atallah passa a introduzir riscos digitais sobrepostos à imagem, brincando com a ideia da granulação, resgatando cenas de filmes mudos e películas coloridas à mão, como nas primeiras décadas do cinema. Trata-se de uma sequência vertiginosa de excessos, algo pertinente ao tema retratado (o delírio do personagem, o apocalipse), porém pouco estimulante como releitura do cinema. A simples colagem de linguagens antigas pode se comunicar bem com plateias cinéfilas – o filme foi particularmente bem recebido no Olhar de Cinema -, no entanto limita-se a seu valor de coleção, de citação.

    A apropriação da história do cinema neste caso torna-se retórica: o simples fato de mencionar o cinema mudo pretende constituir um valor em si, adquirindo uma aura de inteligência e investindo na concepção de “cinema experimental” pop e acessível, que afinal experimenta muito pouco. Rey se conclui como uma aventura ágil, colorida e engraçada, mas vazia em sua releitura cinematográfica, e apolítica no que diz respeito ao tema da colonização europeia em solo americano.

    Filme visto no 6º Olhar de Cinema - Festival Internacional de Curitiba, em junho de 2017.

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