“Cafarnaum” é uma joia preciosa do cinema libanês contemporâneo. Dirigido por Nadine Labaki e escrito em colaboração com Joelle Keserwani, Jihad Hojeily e Georges Khabbaz, o filme apresenta uma história profundamente comovente e provocadora. A trama acompanha a jornada de Zain, um garoto que, em meio à miséria extrema, toma a decisão radical de processar seus pais por terem lhe dado a vida. Com uma abordagem ousada, o filme explora as duras realidades da pobreza, negligência e injustiça enfrentadas por crianças marginalizadas no Líbano.
Produzido ao longo de anos, com impressionantes 500 horas de filmagem, Cafarnaum adota o estilo “cinéma vérité” para criar uma narrativa autêntica e visceral. Sem o uso de atores profissionais, a performance do elenco é impressionante. Zain Al Rafeea, em sua estreia no cinema, é uma revelação absoluta, transmitindo uma intensidade emocional rara. A atriz que interpreta a empregada etíope, assim como o juiz aposentado que assume seu próprio papel, contribuem para o realismo marcante da obra. De fato, o filme é tão imersivo que, em muitos momentos, é difícil discernir se estamos assistindo a uma ficção cuidadosamente roteirizada ou a um documentário cru.
A cinematografia é igualmente notável, revelando o lado mais sombrio do Líbano – bairros negligenciados e condições de vida que clamam por justiça social. A trilha sonora, assinada por Khaled Mouzanar, eleva ainda mais a experiência, proporcionando uma camada emocional que complementa a narrativa com perfeição.
“Cafarnaum” é um feito extraordinário, e o Prêmio do Júri em Cannes é mais do que merecido. A última cena do filme ecoa o impacto de clássicos como Os Incompreendidos (1959), de François Truffaut, ao transmitir esperança em meio à adversidade. Nadine Labaki entrega uma obra devastadora, porém essencial, que ressoa muito além das fronteiras culturais e geográficas. Uma verdadeira obra-prima.