Além de ser o título do filme dirigido e co-escrito por Nadine Labaki, Cafarnaum é um termo que faz referência ou a um lugar em que há tumulto ou desordem ou a um local onde objetos diversos são amontoados ou guardados desordenadamente. Ou seja, quem está no cafarnaum está diante do caos. Quando conhecemos a realidade na qual Zain (Zain Al Rafeea) vive, entendemos o por quê do longa ter esse nome.
Aos doze anos, Zain é um típico exemplar de uma criança que, devido às suas circunstâncias de vida, não consegue ser, agir e ter as mesmas experiências que outros meninos de sua idade. Ele não estuda ou tem momentos de lazer. Da forma como é retratado pelo roteiro, Zain é o que podemos chamar de provedor de sua família, o verdadeiro adulto da casa. Ele trabalha e se submete a diversas situações degradantes e sufocantes para poder trazer o sustento para seus pais e seus irmãos.
Apesar da pouca idade, é certo que Zain tem uma consciência muito grande do seu papel e das responsabilidades que ele possui. Chega a ser chocante que ele seja o único a se sentir revoltado quando sua irmã, de 11 anos, a quem ele amava muito, é forçada a se casar com um homem mais velho. Para os pais dele, o que era uma oportunidade de se “livrar” de mais uma boca para alimentar, para Zain significou o limite do que ele podia suportar.
A jornada de Zain,
do momento em que ele decide sair de casa, até o instante em que ele faz a escolha que mudará por completo o curso de sua vida
, é o eixo principal de Cafarnaum. No filme, o menino entra em contato com pessoas e com histórias semelhantes à sua, ao mesmo tempo em que vivencia um estranho sentimento de acolhimento, de cuidado e de amor, diante de toda essa confusão que é a existência dele.
Vencedor do Prêmio do Júri do Festival de Cinema de Cannes 2018 e indicado ao Oscar 2019 de Melhor Filme Estrangeiro, Cafarnaum é um longa intenso e forte, que deixa a gente com um nó na garganta difícil de desatar (mérito de uma atuação visceral do menino Zain Al Rafeea). Mais do que uma história de um garoto que é uma vítima de uma realidade injusta de miséria e de exploração que ele não escolheu viver, de um Estado que não ampara seus habitantes e de pais negligentes; este é o relato de algo que é muito mais comum do que a gente imagina. Existem muitos Zains por aí.