Cinema de imersão
por Francisco RussoCom a popularidade do streaming, cada vez mais se têm investido firme no cinema como evento. A ideia é atrair o espectador não apenas pela clássica proposta da projeção coletiva em um ambiente isolado de tudo à sua volta, mas também criar meios que provoquem uma imersão maior com o exibido na telona. Assim o 3D se popularizou e surgiram as salas VIP, 4DX, IMAX e tantas outras que ampliem os sentidos de quem está sentado na poltrona - todas com ingresso mais caro, é bom ressaltar. Já do lado dos estúdios, o esforço tem sido em produzir filmes que também valorizem tais características, muito impulsionado pelo avanço dos efeitos especiais que, nos dias atuais, possibilitam a criação de quase tudo que houver na imaginação de seu realizador.
Tamanho preâmbulo serve apenas para ressaltar que The Aeronauts é um típico filme contemporâneo, que busca se encaixar exatamente nesta proposta acima. Isto porque a ideia é aproveitar a viagem (verídica) de balão feita por James Glaisher e Amelia Wren para proporcionar ao espectador a experiência de estar a bordo, com direito à contemplação e sacolejos intrínsecos. Funciona.
Com isso, a ideia de aventura enfrentada pela dupla deixa de ser apenas no âmbito do desafio para, também, mergulhar o espectador em uma verdadeira montanha-russa, com direito a sequências de ação de tirar o fôlego. Vale lembrar que o voo em questão aconteceu em 1862, bem longe da segurança dos dias atuais, o que amplia ainda mais a sensação de risco iminente.
Diante de tal proposta, o que há ao redor soa como mera conjuntura que possibilite as tais sequências imersivas. Ainda assim, alguns pontos merecem ser destacados. Um deles é a postura feminista encampada pelo longa-metragem, com a personagem de Felicity Jones não apenas se recusando a ser uma mera esposa mas, também, tendo participação ativa (e decisiva) nas inconstâncias a bordo do balão. Há ainda um interessante paralelo sobre a necessidade de parceria entre a ciência e o entretenimento, como forma de se financiar e conquistar o coração do público, que rende boas sequências nos momentos iniciais do voo. Soma-se a isso uma Felicity carismática e inspirada, carregando o filme nas costas diante de um Eddie Redmayne um tanto quanto apático, sem seu tão conhecido brilho no olhar quando se vê diante de algo fascinante - quem já assistiu A Teoria de Tudo ou algum dos Animais Fantásticos, conhece bem tal característica.
Visualmente belo, The Aeronauts investe firme em uma fotografia paisagística de forma não só a realçar os momentos de paz e silêncio como, também, deslumbrar o espectador a partir da excelência técnica e um figurino de época convincente. Há ainda o curioso contraste que um filme que busca ser o mais contemporâneo possível em termos de cinema beba da fonte de algo quase anacrônico nos dias atuais, o balonismo. Um bom filme, que merece ser visto na sala de cinema de forma a plenamente atender sua proposta narrativa.
Filme visto no Festival de Toronto, em setembro de 2019.