Uma nação de neuróticos
por Bruno CarmeloNesta viagem de família, tudo dá errado: o carro tem problemas técnicos, os filhos não se entendem com a mãe, o trânsito impede a viagem, o GPS indica o caminho errado. O quarto episódio da franquia Diário de um Banana explora um cânone do american way of life: a comunhão familiar na estrada durante o período de férias, época de comer sanduíches e explorar os cenários do país. A série infantil sempre trabalhou em cima de símbolos consagrados (o sistema de castas nos colégios americanos, a hierarquia dentro da família patriarcal) para expor certa histeria no comportamento de todos hoje em dia, de adultos a crianças.
Em comparação com filmes infantis que mostram a imaturidade das crianças e as virtudes dos pais, Caindo na Estrada trata todos os seus personagens como caricaturas: a mãe só fala em levar uma vida livre de tecnologia, com comidas orgânicas, enquanto os filhos nutrem uma obsessão cômica pelos telefones celulares e ídolos do YouTube. O crescimento não implica um amadurecimento, apenas troca de neuroses: mesmo o pai se revela incapaz de desgrudar do trabalho. Na jornada rumo à festa de aniversário da bisavó, a família Heffley força a convivência de pessoas angustiadas, agindo como acham que deveriam, e não como realmente gostariam. A franquia retrata com deboche as regras dos bons costumes.
Enquanto crônica de uma geração, o roteiro se sai muito bem. Mesmo com a direção hiperbólica, pautando qualquer gesto com um efeito sonoro engraçadinho, o diretor David Bowers sabe criar cenas assustadoras, como o pacote de salgadinhos caindo na jacuzzi e transformando toda a água num pântano alaranjado – algo muito mais potente do que os discursos da mãe contra junk food. Susan e Frank estão longe de serem pais perfeitos, demonstrando cansaço na criação dos filhos, o que transmite uma visão menos idealizada da paternidade. Neste núcleo, quem dá as cartas é a mãe autoritária, uma competente Alicia Silverstone. Tom Everett Scott e o novato Jason Ian Drucker também compreendem este humor exagerado por si só, dispensando uma gestualidade expressiva.
O único nome destoante no elenco é Charlie Wright, o novo Rodrick, atuando uns cinco graus acima dos demais, num festival grosseiro de caras e bocas. Se os outros atores embarcassem neste nível de performance, o resultado seria uma catástrofe. No final, bons achados como a divertida paródia de Psicose convivem com cenas questionáveis como o passeio mal filmado no parque de diversões e o ataque incongruente dos pássaros. Na tentativa de explorar tudo o que poderia acontecer de errado numa única viagem, o roteiro sai de situações divertidas porque plausíveis (crises na hora de escolher a música, a comida, problemas com o mapa) para chegar a situações insossas, porque inverossímeis naquele contexto. Os excessos fazem parte da comédia e do universo infantil, mas até uma produção lúdica como Caindo na Estrada tem seus limites à suspensão da descrença.
Apesar dos problemas, o resultado é uma autoparódia do espírito americano, algo menos ingênuo do que poderia aparentar. O fato de assumir o ponto de vista do garoto ajuda a tratar com seriedade alguns dilemas da infância, sem o olhar condescendente que costuma acompanhar este tipo de produções. Sim, as tradicionais lições de vida e frases de efeito dominam o terço final da trama, enfraquecendo o resultado. Entretanto, antes da conclusão a “terra dos corajosos e livres” tem a coragem de se sujar e rir de si própria.