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    Tokyo Ghoul
    Críticas AdoroCinema
    1,5
    Ruim
    Tokyo Ghoul

    O monstro em mim

    por Bruno Carmelo

    Primeiro, é uma ótima notícia ter um filme como Tokyo Ghoul no circuito brasileiro. A cultura japonesa é raramente representada nos nossos cinemas, com exceção dos dramas premiados em grandes festivais. Um blockbuster adolescente como este, adaptado de um mangá de sucesso, permite ao público local descobrir outra forma de retratar a sociedade e de pensar o cinema. Em nome da diversidade da oferta audiovisual e da descentralização da cinematografia norte-americana, pode-se torcer para que outros projetos como este cheguem às salas.

    O fato é que, ao se apresentar aos olhares estrangeiros, o filme será analisado segundo outros critérios, outras referências culturais. Em outras palavras, a percepção de qualidade em um lugar não será a mesma de outro lugar – o valor de um filme está sujeito ao contexto em que se encontra. Assim sendo, é preciso estabelecer que este texto não pretende traduzir a recepção dos japoneses, nem a de conhecedores do mangá. As considerações abaixo não discutem o filme enquanto adaptação, e sim como filme de ação autônomo, que precisa fornecer as chaves de leitura necessárias para ser compreendido separadamente de sua origem literária.

    Neste contexto, Tokyo Ghoul se baseia num roteiro bastante frágil. A ideia de um garoto meio humano, meio carniçal, tendo que aceitar as suas diferenças num mundo que o persegue poderia funcionar como boa metáfora para a inclusão social. No entanto, o roteirista Ichiro Kusuno apoia-se numa sucessão de coincidências e reviravoltas improváveis para fazer a narrativa andar – vide o destino da primeira garota-ghoul, a necessidade de visitar um cemitério à noite ou ainda a transformação do tímido Kaneki (Masataka Kubota) numa máquina de matar através de um curto treinamento em estilo Rocky, um Lutador. O projeto é permeado por clichês narrativos e melodramáticos, incluindo o abuso de trilha sonora, criancinhas indefesas precisando de resgate ou o duelo com o super vilão durante o clímax.

    Mesmo em se tratando de um filme de ação, a narrativa soa arrastada: o diretor Kentaro Hagiwara repete à exaustão as cenas de dificuldade de alimentação dos ghouls, por não suportarem a comida humana, e prejudica a aguardada luta final através da montagem lenta e repetitiva. A trama se dedica tanto à descoberta de Kaneki a respeito de seus próprios poderes que se atropela na hora de transformá-lo em super-herói, gerando um ritmo desigual. Talvez o resultado funcione como filme de gênero, com algumas boas cenas sangrentas e efeitos especiais competentes. No entanto, jamais consegue combinar seu aspecto dramático-realista (a contaminação via transplante de órgãos) com a vertente fantástica (os poderes, as modificações corporais, os olhos coloridos).

    O resultado é prejudicado pela dublagem nacional apresentada aos críticos, e também ao público. Compreende-se que a versão dublada contribua a popularizar o gênero. Entretanto, a versão nacional torna a experiência artificial, de difícil imersão. As frases são exageradamente articuladas, as escolhas de palavras soam inadequadas (o inspetor formal que responde “Tá legal” a um pedido de investigação), e os inúmeros gemidos, suspiros e respirações ofegantes de Kaneki são mal agenciados pela mixagem. O som das falas fica tão diferente dos ruídos e da trilha que parece não pertencer ao mesmo ambiente. Se a ideia era imergir o espectador numa história diferente, numa cultura alheia, seria fundamental que a língua japonesa se mantivesse. Os fãs da cultura oriental agradeceriam.

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