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    Invisível
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Invisível

    Tensão pré-aborto

    por Francisco Russo

    Não é de hoje que o cinema argentino é invejado por sua capacidade em associar o binômio roteiro e atuações de forma tão naturalista e, ao mesmo tempo, envolvente. Sem efeitos especiais nem grandes produções, mas com muita inteligência e habilidade, vários são os exemplos recentes que caminham nesta fórmula de baixo orçamento e muita inspiração. Invisível, segundo longa dirigido por Pablo Giorgelli, segue esta mesma linha, mas sem tanta inspiração.

    De certa forma, Invisível bebe da estrutura narrativa estabelecida pelo diretor em seu filme anterior, o cultuado Las Acacias. A partir de um silêncio solene, o espectador é convidado a adentrar na vida da jovem Ely (Mora Arenillas), que se divide entre aulas entediantes, o trabalho em uma pet shop e cuidar da mãe, que se recusa a sair de casa. O único momento de agito em sua vida vem nas recorrentes transas no carro com seu chefe, sempre às escondidas. Ainda assim, elas são um tanto quanto mecânicas; passada a excitação do momento, não há envolvimento emocional entre eles. É apenas sexo, nada além disto.

    A ambientação meticulosa de tal universo, não só pelos atos mas também pelas percepções emocionais da protagonista, vai de encontro à cartilha de cinema segundo Giorgelli. Assim como em Las Acácias, muito é dito a partir das imagens retratadas, de forma a compreender o contexto em torno desta jovem de 17 anos que sente a solidão de ter tamanha liberdade de ação. Entretanto, mais do que meramente retratar tal cotidiano, o diretor tem outro objetivo: apresentar o drama tão corriqueiro acerca da gravidez inesperada com tão pouca idade. Sem querer gerar a nova vida, a saída é o aborto.

    Inicia-se então uma nova fase na narrativa, onde, mais uma vez, Giorgelli pontua de forma bastante sutil suas posições políticas, sobre o direito da mulher ao próprio corpo e a legalização do aborto. Não há estardalhaço nem defesa ideológica, mas o retrato cotidiano da tensão existente em uma situação do tipo. É a partir do inevitável nervosismo de sua protagonista que o diretor apresenta sua história, mais uma vez contando com as minúcias típicas do comportamento humano.

    Por mais que tamanha observação seja interessante, tal proposta narrativa faz também com que Invisível tenha um ritmo bastante vagaroso, e até cansativo em certos momentos. A ausência de uma postura mais decidida também incomoda, por mais seja compreensível que isto não aconteça de forma a servir tal visão de cinema. Ainda assim, há uma certa simplicidade no roteiro que nem sempre é compensada pela estrutura empregada, em parte devido à uma certa apatia emocional que domina boa parte da história.

    Com um elenco coeso e sem destaques diante da proposta empregada, Invisível é um filme cuja história soa simples mas que, estruturalmente, possui um certo refinamento narrativo que, por sua vez, é mais interessante conceitualmente do que na prática. Mais interessante do que propriamente bom, vale mais pela observação desta vertente no modo de contar uma história na sétima arte.

    Filme visto no 19º Festival do Rio, em outubro de 2017.

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