“Monty Python” deixa claro que o destaque sempre será a piada, o riso, e nunca a vaidade de quem é ou não capaz de fazer rir, e por tamanha entrega e generosidade já temos um bom motivo para acompanhar essa história.
O filósofo Henri Bergson dedicou boa parte de seus estudos sobre a comicidade, como podemos verificar no livro de sua autoria (O RISO — ENSAIO SOBRE A SIGNIFICAÇÃO DO CÔMICO). Em tal obra, que esgarça a fundamentação do riso, Bergson pontua uma ideia na qual o grupo inglês de comédia "Monty Python", a utiliza quase como tese, no caso: O riso é a mecânica aplicada no ser vivo.
Em "Monty Python & the Holy Grail" (1975), temos toda a distribuição de uma mecânica aplicada de forma sútil, sem didatismos ou apresentados de forma obrigatória na tentativa de provocar o divertimento do público, apesar de ser uma comédia, não é realizada escancaradamente tal como convencionalmente outros filmes do gênero se propõem, algo que pode ser verificado no filme "The Meaning of Life", trabalho posterior desse mesmo grupo, que utiliza de "sketches", algo simplista e raso na construção de comicidade, principalmente se considerarmos a complexidade do efeito cômico empregado em um longa-metragem com história focal e linear.
A comédia cujo foco de sátira principal é sobre a lenda do Rei Artur, é um trabalho escrito e realizado pelo grupo Monty Python e que contou com a direção de Terry Gilliam e Terry Jones. A sátira empregada expande os seus limites ao mostrar um rei em uma missão sagrada, e que por ser crente demais da sua condição, provoca risos ao ter essa seriedade interrompida ao cavalgar em um animal imaginário, que só existe através das batidas de um coco, um efeito sonoro encarregado ao seu ajudante Patsy (Terry Gilliam), a sonoridade é suficiente para o Rei Arthur dos Bretões (Graham Chapman) crer ter de possse um cavalo que o acompanha pelas terras inglesas. Esse efeito não só do som, mas de um rei quase aos moldes do conto dinamarquês "A roupa nova do rei", onde um nobre desfila pelado, porém, acreditando trajar uma bela roupa, pois, assim lhe falou seu alfaiate, enfim, essa postura louca, imaginativa do Rei Artur somado ao som dos cocos serão cálculos resultantes de uma soma mecânica recorrente no filme, algo que Bergson identifica como mecânica da repetição para o riso.
“A repetição, uma combinação de circunstâncias que se repete exatamente em várias ocasiões, contrastando vivamente com o curso cambiante da vida - será tanto mais cômica a repetição (ou coincidência) quanto mais complexa for a cena repetida e quanto mais natural for representada (duas condições - complexidade e naturalidade que parece se excluírem, e que a habilidade do autor teatral deverá conciliar)”. Bergson, 1900.
O destaque dessa repetição característica em"Monty Python & the Holy Grail" é a sofisticação na qual ela é construída, e nos momentos em que é inserida, pois, é algo que corre o risco de ser cansativo ou batido, mas que no filme exerce um encanto ao ponto de queremos mais. O mesmo efeito ocorre em todas as circunstâncias nas quais o Rei Artur e seus companheiros tentam invadir castelos, porém, nunca conseguem. Já que as tentativas, essas diferentes, sempre fracassam, mesmo quando se mostram ser uma excelente ideia, como na tentativa aos moldes do cavalo de Troia, que no filme é substituído por um grande coelho de madeira entregue aos franceses.
Uma interessante divisão realizada para conhecermos em detalhe cada um dos cavaleiros da Távola Redonda, é justamente uma quebra aos moldes do teatrólogo Brecht, uma ruptura com a narrativa ficcional, apresentando um historiador (atual ao período em que a obra foi realizado), e aos molde de um programa televisivo, explica ou tenta explicar o que ocorreu com os cavaleiros, porém, um desfecho tragicômico é dado ao professor, essa quebra não utilizada de forma gratuita, ganha destaque permanente a medida que retroalimentar o enredo do filme, evocando momentos de risos através da repetição de interrupções da história medieval por uma investigação policial moderna.
Com a ruptura que permite conhecermos melhor figuras como o inteligente Sir Bedevere (Terry Jones), o bravo Sir Lancelot (John Cleese), o casto Sir Galahad (Michael Palin), e Sir Robin (Eric Idle), o público é agraciado com atuações impecáveis. Temos em cada ator um preciso "time" para o riso e um jogo de escadas entre o grupo "Python" deixando claro que o destaque sempre será a piada, nunca a vaidade de quem é ou não capaz de fazer rir, e por tamanha entrega e generosidade já temos um bom motivo para assisti-los.
A direção e a fotografia, cometem deslizes primários de registro, em algumas cenas, por exemplo, há desfoque de lente, e a utilização de planos abertos nem sempre conseguem comunicar a dimensão do que se deseja revelar, talvez isso ocorra por um limite de orçamento, já que muitas das cenas de planícies são achatadas em planos médios que não dão conta de registrar castelos e povoados (algo que necessita de investimentos para construção), já nas cenas sombrias ou de névoas, o uso de close's, big close's e planos abertos, ao invés de auxiliar em qualquer dialogação, só complica e diminuem o efeito cômico pretendido.
É válido ressaltar quem os momentos de inserção das animações são todos, muito bem inseridos, além da arte impecável que colabora e auxilia na construção de uma proposta cômica, e mesmo sendo desenhos inseridos em uma história de humanos, são empregados com naturalidade. Como Bergson explica, isso se dá quando certo efeito cômico derivar de certa causa, quanto mais natural a julgarmos tanto maior nos parecerá o efeito cômico: rimos já do desvio que se nos apresenta como simples fato. Mais risível será o desvio que virmos surgir e aumentar diante de nós, cuja origem conhecermos e cuja história pudermos reconstituir. A causa da inserção desses desenhos no filme são sempre resultados de um mundo e de uma ordem divina, que saem do plano terrestre e apresentam-se como mundo do extra-plano humano, e se registram tal como as ilustrações da igreja católica na idade média, porém, sem a seriedade do traço da igreja, mas sempre do traço cômico.
Por último, destaco que ao se apropriar de uma história medieval, o grupo britânico soube indiscutivelmente tratar da significação social, criando um trabalho atemporal. O enredo é fortalecido pela ideia de um riso em grupo, pois, não desfrutaríamos o cômico se nos sentíssemos isolados - o riso parece precisar de eco, de cumplicidade com outros galhofeiros, reais ou imaginários, algo que os "Python's" sabem bem.