Depois do amanhecer
por Lucas SalgadoNascido em São Paulo, mas radicado nos Estados Unidos, o jovem diretor Gabe Klinger fez sua estreia nos cinemas em 2013, com o documentário Double Play, sobre Richard Linklater. Agora, debuta no cinema de ficção com Porto. E é clara a influência de Linklater em seu primeiro trabalho. É impossível conferir o filme e não lembrar da trilogia Antes do Amanhecer e seu estilo verborrágico e romântico, ainda que sem um final feliz.
Saem Jesse e Celine, entram Jake e Mati. Saem Julie Delpy e Ethan Hawke, entram Lucie Lucas e Anton Yelchin. Sai Viena, entra Porto. A comparação é inevitável, afinal tratamos de um casal formado por uma francesa e um americano em uma cidade estrangeira para os dois. Mas é importante destacar que não são o mesmo filme.
Klinger opta por não contar apenas a história do primeiro encontro do casal, mas todo seu relacionamento, do encantamento ao desgaste. Através da competente montagem de Géraldine Mangenot e do próprio Gabe, o filme joga com as emoções do espectador. ao embaralhar a história do casal, Porto oferece um final da história de amor que não é necessariamente o final do longa.
Contado na ordem cronológica, o filme estaria destinado a ser uma aborrecida trama de amor. Na forma como vemos, valoriza-se a imaginação e a força do cinema. De certa forma, nos lembra a conclusão de Desejo e Reparação, que oferece ao casal principal um final que eles não tiveram na "vida real".
Produzido pelo cultuado Jim Jarmusch, o longa é um dos últimos estrelados por Yelchin, falecido recentemente. É difícil não olhar para ele com certa melancolia, ainda mais em um papel tão denso, em um personagem tão complexo. Ele vive um homem sem muito rumo na vida, perdido num país estranho e que, numa noite, parece encontrar a pessoa perfeita para ele. Lucie é esta pessoa. Sua Mati conquista não apenas Jake, mas também o público. Trata-se de uma personagem independente que valoriza sua liberdade.
A cidade portuguesa também tem participação importante na história, sendo uma espécie de terceira protagonista. Se narrativamente o filme funciona, não há como deixar de apontar alguns problemas, principalmente no que diz respeito a trilha sonora, toda no piano, e muito repetitiva. A fotografia apresenta problemas de personalidade. Oferece algumas imagens bonitas da cidade e do casal, mas se perde ao tentar ser estilosa demais, principalmente pela utilização de imagens muito granuladas.
Porto é um drama romântico. E seria apenas mais um drama romântico se não oferecesse ao espectador uma conclusão de fantasia. E, por nos fazer sonhar, é uma obra que merece destaque.
Filme visto na 40ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2016.