Cenas de uma festa de casamento
por Francisco RussoNo mundo do cinema é assim: basta um filme de sucesso para sua carreira ser catapultada a outro patamar, favorecendo não apenas a obtenção de mais recursos como, também, entregando uma maior liberdade de escolha sobre os projetos vindouros. Foi o que aconteceu com a dupla Eric Toledano e Olivier Nakache após a explosão de Intocáveis, o filme francês mais visto em todos os tempos, que já virou peça teatral no Brasil e foi refilmado na Argentina e nos Estados Unidos. Entretanto, apesar de tamanho sucesso, os diretores não se renderam à sedução hollywoodiana e permanecem rodando seus filmes na França natal, seguindo a linha bem conhecida da comédia dramática. Assim foi com Samba e, agora, com Assim é a Vida.
Pela primeira vez sem Omar Sy no elenco - e também sem um astro como protagonista -, o longa-metragem é uma espécie de filme-coral situado em uma festança de casamento, realizada em um típico (e belíssimo) castelo francês. Narrado ao longo de um único dia, Assim é a Vida percorre os bastidores de tal evento de forma a realçar não só conflitos típicos do trabalho como, também, questões pessoais de vários dos coadjuvantes presentes. É na junção destas historietas, sempre flertando com a comédia de situação mas sem descambar para o escracho, que a narrativa flui no sentido de oferecer ao espectador um ambiente requintado sem ser esnobe. A beleza ao redor faz parte da própria narrativa.
Neste cenário, cabe ao dono da empresa que coordena a festança o posto de protagonista: Jean-Pierre Bacri é bastante eficiente no papel do chefe respeitado que cobra, ao mesmo tempo em que abre espaço para que todos à sua volta consigo falem. Em torno de si giram alguns dos principais cenários deste longa-metragem, como a importante questão trabalhista acerca dos direitos dos empregados e, também, da legalização dos mesmos - uma pequena síntese da cada vez mais mestiça população francesa -, a necessária agilidade para resolver problemas inesperados e, é claro, insatisfações pessoais acerca do negócio que conduz e no romance com uma colega de trabalho. Soma-se a isto observações pontuais (e contemporâneas) acerca da pluralidade cultural decorrente desta mesma miscigenação social e ainda a necessidade de um fotógrafo profissional em uma era onde os celulares são câmeras cada vez mais poderosas. Cada um destes pontos é fruto de uma atenta observação dos também roteiristas Toledano e Nakache, sobre o mundo que os cerca.
Ainda assim, a dupla de diretores/roteiristas também se rende a alguns clichês, como o egocêntrico noivo com ares vilanescos, que faz o que pode para irritar todos à sua volta - um contraste com a alegria da celebração de seu casamento que, nem sempre, funciona bem na história. Mesmo a subtrama da paixonite de um dos funcionários pela noiva é mal desenvolvida, tanto em sua origem quanto no desdobramento. Por outro lado, o filme conta com um Gilles Lellouche inspirado, no limiar entre o popular e o canastrão, e ainda as boas presenças de Alban Ivanov e Eye Haidara.
Sem buscar o riso fácil, Assim é a Vida busca entreter o espectador a partir da construção de uma narrativa envolvente e divertida, contando com um elenco bastante coeso e competente em uma ambientação requintada, onde educação e comportamento são mantras a serem seguidos. Destaque para a linda fotografia a partir da iluminação a luz de velas e também para a ótima trilha sonora, que transita entre os hits habituais de festanças do tipo à sofisticação musical da bossa nova.
Filme visto na 41ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2017.