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    João, o Maestro
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    João, o Maestro

    Busca diabólica

    por Francisco Russo

    Se o cinema brasileiro tem um especialista em biografias, este é Mauro Lima. Veterano de Meu Nome Não é Johnny e Tim Maia, o diretor brasileiro retorna à vertente ao trazer para as telonas a vida e obra de João Carlos Martins, pianista prodígio da música brasileira que, apesar de atingir o estrelato muito cedo, enfrentou problemas de saúde que abreviaram sua carreira. Entretanto, mais do que a realização de uma nova cinebiografia, o que realmente chama a atenção é o quanto João, o Maestro é diferente de seus trabalhos anteriores.

    Se Meu Nome Não é Johnny tinha o sarcasmo e a vida desregrada como preâmbulos básicos, tais características também surgiam com força em Tim Maia. Já a cinebio de João Carlos Martins vai no caminho inverso: solene, um tanto quanto sisuda, até mesmo careta. Em parte graças ao universo em torno do personagem-título, com o requinte típico da música clássica refletido da postura à entonação de voz, passando ainda pelas cores neutras e ambientes "comportados". Consciente de tal proposta, o diretor provoca uma certa quebra em tamanha rigidez visual quando João perde o controle, seja no aflorar de seu lado mulherengo ou quando ultrapassa seus próprios limites físicos. É quando o filme, enfim, atinge seu maior impacto visual, especialmente nas cenas em que o esforço contínuo em superar a doença resulta em consequências sangrentas.

    Por outro lado, a linguagem visual é também extremamente didática, seja ao repetir em close situações ditas pelos personagens ou pelo mero uso do tradicional plano/contraplano em cenas até mesmo simples - atenção à conversa entre as crianças, envolvendo o possível cancelamento das aulas de piano. Além disto, o longa possui problemas na condução das três fases da vida de João. Por mais que seus respectivos intérpretes até sejam competentes (Davi Campolongo, Rodrigo Pandolfo e Alexandre Nero), a edição confusa gera dúvidas acerca da infância do personagem-título, especialmente em relação ao onipresente curativo no pescoço. Por mais que seja um elemento que traga fidelidade à vida do verdadeiro João Carlos Martins, sua utilização é não só mal aproveitada como prejudicial ao filme como um todo, justamente por gerar uma certa desconfiança acerca da história contada. O mesmo vale para as cruciais sequências da Portuguesa em Nova York e do acidente na Bulgária, tão bruscas quanto artificiais.

    Diante destes problemas pontuais, que ganham relevância por serem em momentos-chave da história, um acerto de João, o Maestro é a opção em focar no lado obsessivo de seu personagem-título. Da infância incentivada pelo pai (Giulio Lopes, extremamente carismático) ao lado sisudo de Padolfo e Nero, a dedicação à música e o confronto entre corpo e alma norteiam o longa-metragem, superando cada adversidade imposta pela vida. Apesar disto, chama também a atenção a ausência de paixão vinda dos três intérpretes; é como se o sucesso pela música fosse algo a ser atingido como meta, deixando de lado a paixão inerente por tamanha procura. Daí vem a tal busca diabólica, mencionada no próprio filme e antecipada pelo preâmbulo.

    Dentre os vários problemas conceituais em torno da narrativa, alguns provocados pela própria direção, João, o Maestro se sustenta nas boas atuações dos protagonistas - Alexandre Nero, especialmente - e de coadjuvantes bem trabalhados, como Giulio Lopes e o professor interpretado por Caco Ciocler, além da própria história de vida de João Carlos Martins, repleta de tombos e reinvenções.

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