Descompasso
por Taiani MendesUm feliz pizzaiolo cego é confrontado pela amada esposa com a possibilidade de voltar a enxergar, o que não acontece desde uma infância já distante e esquecida. Apresentado como principal dilema de Teu Mundo Não Cabe nos Meus Olhos, novo filme de Paulo Nascimento, o dilema se resolve de forma incrivelmente rápida na trama. Vagaroso como a rotina sem surpresas do protagonista Vitório (Edson Celulari) pelas ruas calmas do Bixiga, tradicional reduto de imigrantes italianos na capital paulista, o longa-metragem segue uma rota melancólica de desejos fracassados, culminando na vitória do conformismo plácido. Uma volta no quarteirão que deixa na boca certo amargor de tempo perdido.
O fato de Celulari interpretar um deficiente visual motiva que a maior parte do filme seja dedicada unicamente aos seus esforços dramáticos, mesmo nos menores gestos. A câmera, no entanto, não é um aparelho de radiografia e de nada adianta o personagem no centro de todos os planos se o roteiro não o constrói apropriadamente.
Frieza é um bom termo para a sensação que a história passa, culpa do roteiro e também da narrativa fragmentada, que estranhamente “poupa” o espectador de qualquer excitação – seja por briga ou romance. Estar na arquibancada de um jogo de futebol nunca foi tão chato e momento mais enérgico é quando ladrões invadem a pizzaria, provocam Vitório e por fim o poupam do pior por “ser aleijado”. O acontecimento obviamente abala o rei das pizzas, mas ao invés de nos aproximar do personagem através de sua dor, o filme pula logo para a consequência do ocorrido.
O bullying, afinal, é livre, repete o protagonista; e não faltam piadas e trocadilhos sobre visão. Apesar de ser sobre Vitório e só ter olhos para ele, Teu Mundo Não... agrada mais quando se volta para os que estão ao seu redor. O torcedor do Internacional que se passa por corintiano por amizade e a mulher que “trocou” o pai rico pelo romance na cantina são personagens capazes de gerar interesse e obviamente têm mais a oferecer do que escada para Celulari, mas acabam reféns dos monólogos do pizzaiolo que só quer que tudo seja do jeito que sempre foi.
Desperdício do talento de Leonardo Machado e Soledad Villamil, que até aprendeu português pra isso. A respeito da filha adolescente vivida por Giovana Echeverria é até difícil falar, pois a personagem é pura instabilidade e a cada aparição traz uma informação nova, o que torna impossível qualquer conclusão sobre sua essência ou função na trama, que trata de dependência apenas da boca para fora.
Com direção de fotografia dedicada a texturas e closes, acompanhando a ideia de “enxergar por dentro” que diferencia Vitório dos demais, Teu Mundo Não Cabe nos Meus Olhos afirma que o mundo dele é baseado na ausência de alterações e que tem coisas que é melhor mesmo nunca ver – ou desver. Apesar de buscar a sensibilização, ao público resta por fim constatar o tanto que o drama sem gana é dependente de seu astro e produtor. E isso não é satisfatório.