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    Estamos vivos
    Críticas AdoroCinema
    1,5
    Ruim
    Estamos vivos

    Segredos e mentiras

    por Bruno Carmelo

    Estamos Vivos constitui um projeto único por combinar dois recursos raros no cinema brasileiro, e ainda mais raros de se encontrar lado a lado. O primeiro deles é o filme em plano subjetivo, visto inteiramente pelos olhos de uma pessoa que não aparece em cena. O segundo é o found footage, geralmente usado para histórias de terror, mas simbolizado aqui pelo registro de um garotinho que filma uma reunião de família despretensiosamente. Depois, ele joga o material no computador e o edita. Ou seja, este é o filme sobre um material que, dentro deste universo, não foi feito para virar filme.

    A situação complica quando se percebe que o registro é feito por uma criança de sete anos de idade. O pequeno Rafa, evocado dezenas de vezes nos diálogos, é um improvável garoto autista que adora estar no centro das discussões, filmando durante mais de 80 minutos sem parar, com grande controle de enquadramentos, movimentos de câmera, profundidade de campo, edição e mixagem. Dizer que a premissa é inverossímil soa como eufemismo: o roteiro exige do espectador uma suspensão da descrença gigantesca para funcionar.

    O alvo do olhar de Rafa é a reunião conflituosa entre seus pais e a família distante após a morte do avô. Já faz mais de dez anos que os filhos não se reúnem, e a presença de todos na mesma casa reacende brigas e conflitos do passado. No início, a dinâmica entre eles pode parecer interessante: mesmo com diálogos artificiais, o elenco se esforça para transmitir naturalidade a uma estrutura essencialmente teatral. Os seis adultos movem-se do sofá para a mesa de jantar, da mesa para a cozinha, criando uma espécie de movimento estéril, que nem sempre desperta conflito.

    Mas o diretor Filipe Codeço e o roteirista Álvaro Chaer não demoram a trazer conflitos de verdade, com um “C” maiúsculo. Aos poucos, as insinuações e desconfortos são trocados pelas brigas físicas e verbais, cada vez mais explícitas. A partir da segunda metade da trama, não existe mais espaço para silêncio narrativo ou metáfora visual: tudo precisa ser dito alto, com a câmera próxima (grande sensibilidade, a de Rafa), jogado na tela como se o aumento do volume e do ritmo fosse sinônimo de acréscimo de realismo.

    Puro engano: quando adentra a histeria completa, Estamos Vivos torna-se difícil de assistir, com seu som estourado e suas revelações tão abruptas que beiram o risível. É uma pena que o roteiro se entregue a um recurso tão fácil, já que o elenco tem seus trunfos: Isabel Chavarri, por exemplo, demonstra grande talento para diálogos, enquanto Patricia Niedermeier efetua um verdadeiro trabalho de composição a partir de uma personagem rasa. Mas é difícil prestar atenção aos detalhes em meio a cenas tão saturadas. A conclusão representa um respiro de alívio para a câmera e para o espectador. Da próxima vez, é melhor Rafa ficar em casa.

    Filme visto na edição paulista da 19ª Mostra de Tiradentes, em março de 2016.

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