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    O Poder e o Impossível
    Críticas AdoroCinema
    2,0
    Fraco
    O Poder e o Impossível

    A provação de um pecador

    por Bruno Carmelo

    O atleta Eric (Josh Hartnett) já teve uma vida de privilégios. Foi um excelente competidor de hóquei no gelo, mas o caráter arrogante e a dificuldade de jogar em equipe levam à sua ruína. Em pouco tempo, ele se torna dependente de drogas. Para ilustrar esta trajetória do topo ao fundo do poço, o roteiro de Madison Turner busca uma alegoria quase literal, fazendo com que o protagonista consuma drogas num belo pico nevado, e depois se perca na hora de descer a montanha, até ter que lutar pela sobrevivência, com fome e frio, redescobrindo a importância da vida e dos valores essenciais.

    O Poder e o Impossível não possui uma narrativa muito sutil, e nem pretende ter. O filme se abre com a narração explicativa de Josh Hartnett e se encerra com um sermão inspirador do verdadeiro Eric LeMarque, que deu origem à história. No meio do caminho, mais explicações: mesmo sozinho, o personagem conversa consigo mesmo em voz alta para o espectador saber o que ele pensa, flashbacks mostram como o pai ausente moldou a sua personalidade problemática, uma funcionária da estação de esqui ensina, por antecipação, que comer gelo é prejudicial à saúde.

    Outro recurso excessivamente claro é a gradação. O diretor Scott Waugh faz com que Eric se perca logo para chegar ao que interessa: o périplo pela neve, a provação divina na qual o atleta fala com os céus e pergunta o motivo de seu calvário. Aos poucos, ele encontra respostas sozinho: ao jogar o resto da cocaína na neve, uma música otimista entra em cena e nosso herói adquire forças suplementares. Drogas são ruins, Deus é bom. A lição poderia servir de motor para um ensinamento básico voltado ao público infantil. Infelizmente, as modestas intenções são prejudicadas por problemas de tom e direção.

    Waugh fica indeciso entre abordar sua história como fábula ou biografia realista de sobrevivência, falhando em ambos os aspectos. Mira Sorvino, no papel da mãe desesperada, atua em registro melodramático, propício aos ensinamentos explícitos. Já Sarah Dumont, como a líder do resgate, opta por um estilo tão contido que beira a desafetação, o desinteresse. Eric às vezes se confronta a problemas concretos, como a ferida grave na perna, que aproxima o registro do realismo. Mas quando chega a noite, uma luz fantástica ocupa a imagem e transforma os cenários em algo próximo de blockbusters como Anjos da Noite. O snowboard é verossímil e bem filmado, já as cenas em família são exageradíssimas, maniqueístas. Ou seja, em termos de estilo, o resultado é caótico.

    Na dúvida sobre como conduzir as cenas, o cineasta perde a tensão essencial ao subgênero do drama de sobrevivência. Os dias de isolamento se sucedem, como indica o letreiro, mas o espectador não percebe um desespero crescente ou um agravante substancial da fome e do estado de saúde. Por mais que reclame e esteja cheio de queimaduras, Hartnett parece forte demais para alguém sem comer há oito dias. No entanto, isso importa pouco ao filme: a intenção era mostrar que qualquer um pode encontrar dentro de si mesmo a força para sair de seus problemas. "Deus não dá um fardo maior do que se pode carregar", sugere a narrativa.

    Trata-se de uma mensagem um tanto simplória - os letreiros finais vendem a experiência de quase morte como “a melhor coisa que poderia ter acontecido” à vida de Eric - mas serve para manipular sensações e transmitir com uma clareza exemplar a moral religiosa. Por mais que, devido ao didatismo, tenha se perdido a construção psicológica, a complexidade social e a coerência na direção.

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