Ecos do passado
por Francisco RussoDez anos após dividir a direção com Martin Hodara no policial noir O Sinal, Ricardo Darín volta a trabalhar com o diretor - só que, desta vez, apenas como ator - ao lado de outros dois ícones do cinema argentino: Leonardo Sbaraglia e Federico Luppi. É na força deste elenco que está boa parte do interesse trazido por Neve Negra.
Construído como um típico filme de gênero, Neve Negra assume de imediato estereótipos do suspense: o isolamento como personagem da narrativa e mistérios do passado que assombram o presente. A história gira em torno dos irmãos Marcos e Salvador, interpretados por Sbaraglia e Darín, que não se falam há anos. Precisando urgentemente de dinheiro e com uma polpuda proposta em mãos para a compra das terras das família, Marcos é obrigado a reencontrar o hermano na isolada cabana em que vive, rodeada por neve. Ao seu lado segue a atual namorada, que pouco sabe sobre a desavença existente entre eles.
É claro que, aos poucos, o passado vem à tona. Se de certa forma as revelações soam bastante óbvias, a começar por um spoiler escancarado (e ingênuo) envolvendo os próprios irmãos, Hodara demonstra habilidade na condução da narrativa a partir de interessantes e breves planos-sequência em que presente e passado se misturam, transitando entre os mesmos personagens com idades distintas. É como se a câmera fosse cúmplice, em ambas as realidades temporais, trazendo uma densidade narrativa baseada também no próprio isolamento dos personagens frente à nevasca que os cerca, de forma a acentuar a tensão intrínseca entre os irmãos.
Dentro desta proposta narrativa, chama também a atenção a forma como Darín se apresenta: abrutalhado e amargurado, transpirando rancor. Tal postura corporal também incentiva a sensação de confronto iminente, conduzida com habilidade por Hodara em meio aos tais flashbacks em plano-sequência. Isto auxiliado à competência do elenco como um todo.
Entretanto, tamanho interesse na condução da história se dissipa justamente no desfecho frágil, seja pela obviedade das revelações ou mesmo pela forma como tudo é descoberto. É quando o roteiro, escrito pelo diretor em parceria com Leonel D'Agostino, apela para diversos facilitadores de forma a trazer uma solução rápida e pouco convincente. Ainda assim, trata-se de um filme interessante que chama a atenção não só pela boa presença de seu elenco - Darín e Sbaraglia juntos é sempre um bom atrativo -, mas também pela fotografia empregada, por mais que tais artifícios não sejam suficientes para evitar uma certa frustração ao término da sessão.