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    O Sacrifício do Cervo Sagrado
    Críticas AdoroCinema
    4,0
    Muito bom
    O Sacrifício do Cervo Sagrado

    Relações inquietas

    por Lucas Salgado

    Conhecido pelo trabalho no incrível O Lagosta, que infelizmente não foi lançado nos cinemas brasileiros, chegando diretamente na televisão, o diretor grego Yórgos Lánthimos tem se revelado um dos nomes mais radicais e originais no cinema nos últimos tempos.

    O longa anterior trazia a trama absurda de um mundo em que as pessoas não poderiam ser solteiras. Elas eram obrigadas a ficar em um hotel, com um prazo para formar um casal. Caso não conseguissem, eram transformadas em animais. Agora, volta a abraçar o fantástico, ainda que sob a forma de um drama familiar mais intenso.

    O Sacrifício do Cervo Sagrado conta a história de um cardiologista consagrado (Colin Farrell), que vive com a esposa oftalmologista (Nicole Kidman) e com dois filhos, uma adolescente (Raffey Cassidy) e um garoto (Sunny Suljic). Em um núcleo familiar marcado pelo caráter metódico e preciso, como uma cirurgia deve ser, o médico acaba vendo seu dia a dia sofrer um abalo ao manter um estranho contato com o filho de um ex-paciente (Barry Keoghan). Em uma dinâmica nunca confortável, os personagens circulam entre si e uma sucessão de situações vão acontecendo e pegando o espectador de surpresa.

    Perturbador e original. Assim pode ser definido não apenas o filme, mas várias das sequências presentes no mesmo, inclusive uma cena de sexo entre Colin Farrell e Nicole Kidman, que é algo bem mais forte e seco do que costumamos ver nas telas. O mesmo pode ser dito do momento clímax, já próximo ao final, em que vemos que a mente de Yórgos Lánthimos caminha por trilhos diferenciados. E inquietantes.

    É importante não revelar muitas informações, para não prejudicar a experiência dos espectadores, mas não é spoiler destacar que a obra possui elementos alheios à normalidade. O roteiro de Yórgos e Efthymis Filippou é pensado de forma de nunca deixar o público aliviado. Há um clima de tensão e desconforto permanente. Tudo é muito seco e, ao mesmo tempo, nada é muito explícito, criando quase que uma necessidade de catarse por parte do espectador.

    A secura dos diálogos e das relações interpessoais também está presente na fotografia Thimios Bakatakis e na direção de Yórgos Lánthimos. O filme se utiliza muitas vezes de cenários frios, especialmente o hospital. E a câmera está quase sempre acompanhando lentamente seus personagens em planos abertos e centralizados, o que aumenta a sensação de isolamento daquelas pessoas.

    A fotografia também investe em planos-sequências e em tomadas paradas e alongadas ao ponto do desconforto, como quando vemos a jovem Kim cantando "Burn", de Ellie Goulding, em apenas uma das inúmeras alegorias vistas em cena.

    Vencedor do prêmio de Melhor Roteiro no Festival de Cannes, O Sacrifício do Cervo Sagrado é uma obra agoniante. A experiência de assistir é, ao mesmo tempo, convidativa e repelente.

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