Precisamos falar sobre Olga
por Bruno CarmeloO que leva uma adolescente a matar oito pessoas e ferir dezenas com um caminhão, atropelando-as numa calçada em plena luz do dia? É compreensível a fascinação popular diante de psicopatas, pela gravidade de seus atos. Elefante, Precisamos Falar Sobre Kevin e Os Crimes de Snowtown são algumas produções que tentam compreender, através de um olhar retrospectivo, os fatos que teriam moldado a mente dos assassinos. A biografia tcheca Eu, Olga Hepnarová junta-se ao grupo.
O primeiro choque não é suscitado pelo crime verídico, e sim pela estética do filme. A fotografia em preto e branco é cinzenta, sem contraste, enquanto os cortes são bruscos e impedem relação de causa e consequência: logo após uma cena forte, pula-se vários dias ou semanas para mostrar outra cena independente da anterior. Em um momento, Olga está brigando com a família, depois, é vista andando num internato, e depois está dirigindo um caminhão e recolhendo o seu salário. O roteiro estampa uma sucessão de fatos, sem associá-los.
O resultado é a constante impressão de frieza e aleatoriedade. O aspecto conflituoso continua na construção dos personagens, todos bastante desagradáveis: Olga é composta por Michalina Olszanska como uma jovem de traços animalescos e olhar perverso. Sua mãe é o cúmulo do sadismo (ela critica a filha por falhar na tentativa de suicídio), uma possível namorada mostra-se lânguida e desinteressada, as colegas de internato agridem Olga na primeira oportunidade encontrada. É questionável que os diretores Petr Kazda e Tomás Weinreb vilanizem os personagens, sugerindo uma espécie de maldade inerente aos humanos.
Outro problema é a associação entre homossexualidade e psicopatia. Olga é lésbica, sendo retratada pelo roteiro como uma mulher manipuladora, incapaz de ter um relacionamento amoroso por sua tendência agressiva. A relação entre mulheres é vista ora por um prisma fetichista (as garotas se beijando no bar, Olga revelando um seio diretamente à câmera), ora como um desvio de caráter associado à amoralidade da protagonista. Como todas as características associadas a ela são negativas, o retrato brusco da orientação sexual entra no mesmo grupo depreciativo.
Depois de dois terços da narrativa destinados a analisar e descrever Olga, chega a cena do crime, muito bem filmada, e que transforma completamente o ritmo da trama. Entra em cena um “filme de tribunal” típico, linear, acompanhando as últimas horas de vida da protagonista. Trata-se de um segmento eficaz, embora pouco coerente com o ritmo que o precede. Talvez os méritos de Eu, Olga Hepnarová sejam principalmente informativos. No que diz respeito à representatividade do caso, as escolhas dos cineastas mais prejudicam do que esclarecem o aspecto humano do episódio.