Na base do carisma
por Francisco RussoDesde que o Onze Homens e um Segredo original foi lançado, lá em 1960, a diversão maior estava na reunião de tantos astros em um mesmo longa-metragem. A trama em si ficava em segundo plano, de forma a privilegiar momentos em que transbordavam o carisma e a camaradagem entre eles - não por acaso, o icônico (e festeiro) Rat Pack. A ideia se manteve na refilmagem comandada por George Clooney e também em suas duas sequências, por mais que houvesse o inevitável desgaste das franquias que se repetem. Pouco mais de uma década depois, Hollywood mais uma vez investe em tal proposta se apropriando de uma exigência dos dias atuais: o empoderamento das mulheres, também no cinema.
Assim nasce Oito Mulheres e um Segredo, que logo em seus primeiros minutos estabelece uma conexão com a recente trilogia: Debbie Ocean, a nova cabeça da gangue, é irmã de Danny, personagem de George Clooney - uma espécie de referência que ronda permanentemente a trama, é bom ressaltar. A constelação agora reúne não só três atrizes "oscarizadas" - Sandra Bullock, Cate Blanchett e Anne Hathaway -, como outra duas vezes indicada à premiação - Helena Bonham Carter -, uma cantora de sucesso - Rihanna -, uma atriz reconhecida pela carreira na TV - Sarah Paulson - e ainda duas integrantes que atendem a outra exigência dos tempos modernos, a diversidade - Mindy Kaling e Awkwafina. Comandando todo este elenco, foi escolhido... um homem.
Por mais que Gary Ross tenha experiência no universo feminino graças ao trabalho em Jogos Vorazes, em um filme tão afeito às bandeiras da contemporaneidade é de se estranhar tal escolha - é como se Holywood enviasse uma mensagem, "abrimos uma brecha para vocês, mas somos nós que ainda estamos no comando". Mudar para continuar igual, como prega a sempre atual frase de O Leopardo, clássico de Luchino Visconti.
Discussões ideológicas à parte, é preciso ressaltar que Ross não faz feio. Reverente à estética da trilogia dirigida por Steven Soderbergh, o diretor entrega uma aventura rocambolesca que a todo instante flerta com a diversão, por mais que nem sempre tenha suas bases bem fundamentadas. Faz parte da proposta original da franquia, lembra? Carisma acima da história.
Isso, o filme tem de sobra. Por mais que Cate Blanchett não tenha muito o que fazer em cena, sua simples presença já traz um brilho intenso, intrínseco à sua personalidade. Um nível abaixo, o mesmo acontece com Sandra Bullock, Sarah Paulson e Helena Bonham Carter, que ainda entrega um quê de sua persona ao desfilar com figurinos estravagantes. Anne Hathaway até surpreende em um papel antipático, algo raro em sua carreira, enquanto Awkwafina compõe uma personagem espirituosa, auxiliada pelo roteiro. Se Mindy Kaling surge correta, cabe a Rihanna apenas ser Rihanna - sua preguiça em criar alguma personagem é gritante, especialmente nos poucos segundos em que contracena com sua irmã mais nova, Nathanya Alexander, muito mais talentosa como atriz.
Mas retornemos à proposta conceitual do longa-metragem: o filme lhe exigia mais do que isso? Não! Rihanna foi contratada como ícone de uma geração, sua simples presença já era suficiente, mesmo que sua personagem seja pífia. Exigir mais é o mesmo que pedir a Oito Mulheres e um Segredo uma seriedade que jamais esteve em pauta.
É justamente neste espírito que o filme consegue divertir, com tiradas espirituosas explorando o timing e o carisma de suas atrizes em um plano de roubo tão exagerado quanto ilógico - em alguns momentos, os facilitadores de roteiro soam propositais, como se tirassem um sarro também do espectador. Navegando pelo mundo da moda, Oito Mulheres e um Segredo mergulha em figurinos luxuosos, grifes, festas badaladas e, é claro, muita maquiagem. Tudo para deixá-las deslumbrantes e gloriosas, como reza a boa cartilha dos astros.
Diante disso, pouco importa a reviravolta mal fundamentada no terço final, nem mesmo o desserviço às próprias mulheres decorrente da continuidade do golpe. Importa o glamour, as piadas bem colocadas, Cate Blanchett com um terninho mais elegante que o outro, o sorriso decorrente de ver tantas estrelas reunidas em um mesmo filme. Ou, como dizia Marilyn, "diamonds are a girl's best friend". Tin-tin.