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    Críticas AdoroCinema
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    O caçador vai virar caça

    por Bruno Carmelo

    O início desta produção polonesa lembra um grande suspense hollywoodiano, com cenários suntuosos, trilha sonora ameaçadora e movimentos de câmera ostensivos, incluindo grandes tomadas aéreas. Pokot (algo como “Rastro”, em português) se constrói como uma história de assassinatos em série, no qual inicialmente animais selvagens são mortos, e depois os humanos começam a morrer. A dúvida, como de costume neste subgênero, diz respeito o autor dos crimes. Quem está matando tantos caçadores da região?

    A tese sugerida é tão absurda quanto estimulante: os próprios animais estariam organizando uma vingança contra os humanos cruéis, que matam por prazer. Alguns indícios confirmam essa ideia, como as pegadas de bichos ao redor dos cadáveres. Mas a única pessoa capaz de defender a teoria improvável é Janina Duszejko (Agnieszka Mandat-Grabka), idosa excêntrica e contrária aos valores da região: ela é vegetariana, pacifista, amante dos animais a qualquer custo. A antiga engenheira inclusive guarda partes dos corpos de bichos na intenção de servirem à clonagem no futuro. Janina funciona como a “louca do vilarejo”, figura essencial dos folclores interioranos, e também protagonista desta história.

    Em virtude de suas excentricidades, a trama passa a inserir elementos cômicos. Primeiro, o faz de maneira discreta, nas cenas de Janina lendo horóscopos dos policiais. Depois, torna-se uma comédia absurda, com traços românticos e fantásticos. A diretora Agnieszka Holland efetua uma série de combinações inusitadas para agradar o espectador, incluindo flashbacks multicoloridos para apresentar cada personagem (com câmeras lentas e músicas locais, algo em estilo O Fabuloso Destino de Amélie Poulain). O roteiro passa a apresentar grandes vilões, mocinhas indefesas, triângulos amorosos e jovens tímidos que, sem dúvida, ainda vão provar o seu valor rumo à conclusão. Pokot abandona o tenso realismo inicial para embarcar numa configuração quase circense.

    Mas a fusão de registros não para por aí: o filme envereda ainda pelo discurso ambiental, pelo debate sobre o papel da mulher e da religião, além de trazer cenas com fetiches por pés e festas à fantasia. Isso tudo faz sentido? Não exatamente. Mesmo assim, Holland consegue manter o mistério sobre a origem dos crimes e o modo de combatê-los. Este é um prazer simples, típico da estrutura de series de televisão à qual a cineasta está tão acostumada: sabemos que mais cedo ou mais tarde tudo ficará claro e a ordem será reestabelecida, como no final dos episódios de CSI, por exemplo. Todo o imbróglio seria uma simples manipulação dos sentidos, um jogo para o espectador verificar se a sua teoria pessoal se confirma ou não diante da inevitável revelação.

    Ora, depois de tanto suspense, Pokot cansa de brincar. Num corte simples da montagem, desvenda tudo o que aconteceu, de que maneira, quando e onde. Não há explicação narrativa para tal descoberta: Holland simplesmente entrega a verdade para o espectador, como aquele organizador de festa surpresa que conta tudo ao aniversariante por não conseguir manter o segredo por muito tempo. A solução encontrada para o desfecho é plausível dentro da trama, mas um tanto anticlimática. O filme se conclui como um suspense razoavelmente bem-sucedido, uma comédia de poucos risos e uma fábula sem moral definida. Um projeto que, em tantas mudanças, acaba se perdendo junto do espectador.

    Filme visto no 67º Festival de Cinema de Berlim, em fevereiro de 2017.

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