Amor e traição
por Francisco RussoA abertura de É o Amor, novo trabalho do diretor Paul Vecchiali (Noites Brancas no Píer), é ao mesmo tempo inusitada e instigante. Um casal em crise tem sua intimidade revelada pela câmera, ora focada apenas nele, ora focada apenas nela. Tal proposta estética faz com que o longa inicie com um longo plano-sequência, onde apenas um dos personagens é visto em cena. O inevitável estranhamento apenas é desfeito na cena seguinte: outro longo plano-sequência, agora focado na contraparte do casal. Os diálogos se repetem, o espectador tem a chance de desfazer (ou confirmar) impressões iniciais. Dois ângulos que retratam o quão distante estão Odile e Jean, interpretados por Astrid Adverbe e Julien Lucq.
Pouco depois, um segundo casal ganha espaço. Daniel (Pascal Cervo) e Albert (Frédéric Karakozian) enfrentam o cansaço na relação. Especialmente vindo de Pascal, um ator de ego imenso que acredita que possa fazer tudo o que quiser. No caso deles, a proposta estética é completamente diferente. Vecchiali investe em seguidas e prolongadas cenas com os dois conversando, ora sozinhos ora com outras pessoas envolvidas, às vezes relembrando casos passados. O detalhe fica por conta da decoração escancaradamente kitsch da casa em que vivem.
Odile e Daniel, pessoas completamente diferentes que nada têm a ver um com o outro, se encontram e se apaixonam em uma cena divertida, ao som de "That's Love" - não por acaso, título também do filme. A proposta estética diferenciada mais uma vez ganha espaço, já que os coadjuvantes são milimetricamente calculados para que possam compôr o cenário à beira mar. É também o ponto de virada do longa-metragem, que faz com que ambos abandonem seus parceiros em nome de um amor repentino, à primeira vista e avassalador. Simples assim.
Deixemos de lado a lógica em torno desta história - o diretor não está interessado nela. Seu interesse maior é em construir ambientes e para tanto utiliza personagens desconexos que, por mais que digam que possuem sentimentos, jamais os expressam de fato. Há um senso de humor comum que lembra (vagamente) o empregado por Wes Anderson em seus filmes, mas sem a mesma sutileza e habilidade nos diálogos, o que torna o ambiente como um todo bastante hermético. É difícil acreditar nesta história, se envolver com estes personagens. Especialmente a partir de mudanças bruscas e súbitas, como a sexualidade exacerbada de Odile.
Diante de tamanho distanciamento e do pouco interesse na história a ser contada, É o Amor torna-se cada vez mais um exercício de linguagem vazio. Se há um claro interesse visual, especialmente na fotografia e na direção de arte, ambos se perdem na falta de ter o que dizer com os personagens principais. Por mais que sua proposta inicial seja intessante, é pouco para sustentar um longa de ambições bem maiores sobre relacionamentos.
Filme visto na 39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2015.