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    Crônica da Demolição
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    Crônica da Demolição

    Venceram os mais fortes

    por Taiani Mendes

    Imagens de edifícios e estacionamento ocupam a tela enquanto um homem fala sobre o visionário pecuarista chamado Hélio Franco. Crônica da Demolição começa com uma anedota sobre os leões de mármore que ocupavam a frente do Palácio Monroe. Para quem viveu a época ou conhece a história do desmonte, deve ser curioso. Para quem sequer sabe muito bem o que foi o palacete, no entanto, tal início é um pouco assustador. O maior erro do diretor Eduardo Ades (A Dama do Estácio), estreando em longa-metragem, é tratar a construção como algo presente no imaginário popular, desconsiderando as quatro décadas passadas desde que o descamisado senhor Silva, devidamente autorizado, colocou abaixo a antiga sede do Senado Federal sem a menor cerimônia.

    Crônica da Demolição é uma reunião de crônicas dos mais diferentes estilos prejudicada pela falta de um texto de apresentação e de um editor mais sensível na harmonização dos relatos. Patrocinado pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro, o longa é composto por dezenas de depoimentos de arquitetos e urbanistas e a ausência de um historiador contribuindo para a narrativa é bastante sentida. Apesar da organização problemática e bagunçada, porém, é possível aprender e se desiludir ainda mais com a politicagem a partir dos fatos e análises apresentados.

    Projetado para a Exposição Universal de 1904, em St. Louis, o imponente Palácio Monroe foi mostrado nos Estados Unidos, onde arrancou elogios, desmontado e instalado na Cinelândia, Rio de Janeiro, em 1906. Concebido pelo Coronel Francisco Marcelino de Sousa Aguiar, foi sede da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, do Tribunal Superior Eleitoral e do Estado-Maior das Forças Armadas, mas acabou no chão em 1976 após ter o tombamento estranhamente vetado. Por que e como os entrevistados tentam explicar. Entre os culpados estão o (sempre presente) Jornal O Globo, que se empenhou ativamente na campanha de convencimento popular da dispensabilidade do prédio, o Jockey Club Brasileiro, o arquiteto Lúcio Costa, o então presidente Ernesto Geisel e até o Metrô Rio. Um dos deleites dos 80 minutos é ver como cada um dos envolvidos e analistas interpreta a criminosa demolição – e os responsabilizados tentam jogar a culpa para outro. Sim, pois se tem algo que todos concordam é que o primeiro símbolo arquitetônico da República não deveria ter acabado como acabou. Entram na reflexão a conhecida falta de tradição brasileira, no sentido de ignorância e esquecimento do passado; a obsessão pela modernidade, sempre muito marcante no centro do Rio; o conceito da “eugenia predial” e ideais de beleza e feiura; e, como não poderia deixar de ser, as negociatas do poder, a ambição sem limites, o dinheiro. Cada tema desses por si só renderia um bom documentário, mas reunidos aqui, sem aprofundamento, acabam ajudando a embolar ainda mais um filme nada simples, excessivamente falado e por vezes confuso.

    Enquanto tenta absorver a enorme onda de informação que recebe a cada depoimento, o espectador é brindado com maravilhosas imagens de arquivo, planos aéreos, fotos, desenhos. Apesar de notavelmente destoante, é impossível ver o Monroe como um monstrengo, adjetivo usado abertamente para justificar sua destruição, segundo os personagens. No papel pode parecer uma coisa pequena – nossa, um prédio antigo foi demolido por ser feio e ocupar uma área muito valorizada, que “novidade” -, mas o fim do Palácio Monroe representou bem mais do que um ataque injustificável ao patrimônio histórico nacional. Ao chegar nessa conclusão o documentário de Eduardo Ades deixa de ser uma produção recomendada apenas a arquitetos, urbanistas e estudantes da área para se comunicar com os interessados em história e política de maneira geral, ainda que seja tarde demais.

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