Gol aos 45
por Renato HermsdorffAntes que Eu Vá é um filme bem-intencionado, mas que peca ao entregar a mensagem final logo de cara. Cartas na mesa, a hora e meia que se segue serve para cumprir tabela. Ao menos aos 45 do segundo tempo, a boa vontade do espectador é cutucada. Na linha das produções-adolescentes-baseadas-em-livros-cuja-trama-envolve-doença-e-ou-morte (que ganharam força depois do sucesso de A Culpa É das Estrelas), a diretora Ry Russo-Young (Caminho Para o Coração) adapta para os cinemas a obra da escritora Lauren Oliver.
Samantha Kingston (Zoey Deutch, de Jovens, Loucos e Mais Rebeldes, que carece de uma injeção de carisma) é uma jovem bem-nascida como outra qualquer. Socialmente aceita na escola, ela ainda paquera do garoto popular. O que poderia dar errado? A vista da “Dona Morte” (isso é premissa, não é spoiler). Precisamente num 12 de fevereiro qualquer (que eles chamam de “dia do cupido”), a mocinha morre. E, estranhamente, passa a reviver o dia fatídico de novo e de novo. E de novo. Até... aprender a lição (spoiler?)
O fato de cada marcação do roteiro escrito por Maria Maggenti (Finding Carter) saltar aos olhos tira da plateia a possibilidade de ser surpreendida. Sam nem sequer dá “bom dia” ao pais, trata com indiferença a irmã menor, destrata o boyzinho que a corteja e ainda engrossa o coro do bullying contra o patinho feio da turma (papel de Elena Kampouris, de Casamento Grego 2, cuja caracterização grotesca é uma mistura da Sibila Trelawney de Harry Potter com a senhora dos pombos de Esqueceram de Mim 2). Sem sutileza, a abertura do longa-metragem deixa bem claro que Sam precisa ser uma pessoa melhor.
Casando Se Eu Ficar (até a tradução para o português é parecida) com Feitiço do Tempo, o filme parte de uma boa premissa, que se presta a uma discussão até pertinente. No decorrer da trama, Sam tem a chance de experimentar as mais contraditórias decisões: “chuto o balde?” “Ou devo ser boazinha para todo o sempre?” Previsível a maior parte do tempo, o longa ganha pontos mais pelas opções que são evitadas, do que pelas próprias escolhas. Sam não é de todo má; a líder da turma não é uma completa bitch. E a relação de amizade, um dos temas centrais da produção, é retratada com ternura – e verossimilhança.
Mais complacente do que exatamente provocativa para com a plateia, a lição de autoajuda que Before I Fall (no original) tenta empurrar goela abaixo do público só é de fato digna de atenção quando, lá pelas tantas, o filme puxa o tapete do espectador. Porque somente quando ele é tirado de sua zona de conforto, é que é capaz de captar a mensagem. Resta saber se até lá você já não caiu (no sono).