“Uma mulher pode ser o que ela quiser”.
Em meio aos créditos iniciais, está é a frase que abre este novo filme com as icônicas Panteras, originarias do seriado setentista e dos dois longa-metragens dos anos 2000 estrelados pelo trio Cameron Diaz, Lucy Liu e Drew Barrymore (alias, esta, produtora executiva deste longa) – a frase dita pela Sabina de Kristen Stewart aqui já deixa bem claro a intenção deste trabalho da diretora, roteirista e atriz Elizabeth Banks: além de escancarar o empoderamento feminino, o longa quer deixar claro que as mulheres podem (e devem) ocupar qualquer protagonismo em qualquer tipo de filme – e, se o espectador tem aversão a qualquer coisa relacionada a isso, dificilmente irá apreciar o restante da trama, já devo dizer – mas, infelizmente, por trás desta boa intenção da diretora, existem problemas estruturais, rítmicos e soluções narrativas fracas e cheias de clichês do gênero de ação.
O que fica bem evidente em As Panteras é que existe, por parte do roteiro, um tratamento mais realista e menos estereotipado do que havia nos filmes anteriores, onde o sexismo era escancarado, para ressaltar a sensualidade (ou sexualidade) das protagonistas – além de deixar o humor bem menos exagerado do que era – a trama agora se situa como uma continuação indireta dos filmes passados – somos apresentados as novas Panteras: Sabina (Stewart) e Jane (Balinska), que trabalham já a algum tempo para a agência Townsend, que possui inúmeras agentes espalhadas pelo mundo, supervisionados pelos Bosleys de suas regiões – “Bosley” agora se refere a vários supervisores, não apenas a um personagem apenas – em uma breve passagem, o longa deixa claro que as Panteras dos anos 70 e dos anos 2000 pertencem a este mesmo universo, mas agora estão aposentadas – assim como Bill Murray e Bernie Mac, os “Bosleys” dos filmes anteriores – aqui, a função é ocupada pelo personagem de Patrick Stewart, que está se aposentando do cargo – mas, quando um poderoso dispositivo de geração de energia elétrica pode ser usado para o crime pelos empresários Alexander Brock (Claflin) e Peter Fleming (Faxon), a denuncia da cientista Elena (Scott) faz com que Sabina e Jane se envolvam no caso, com a aliança da nova Bosley, chamada de Boz (Banks), uma ex pantera – que vai tentar auxiliar as agentes comandadas pelo misterioso Charlie.
Se Elizabeth Banks acerta em tentar deixar as personalidades das três protagonistas mais realistas, ela erra em querer conduzir a história seguindo uma “cartilha” básica de filmes de ação, aos moldes de Jason Bourne ou Missão Impossível – isso não funciona porque a concepção das cenas de ação é simplória, optando por sequências que chegam a ser lentas – e não! Isso não tem nada a ver com as atrizes – afinal, mesmo que se mostre um longa regular, Stewart, Balinska e Scott, realmente, são as melhores coisas de As Panteras – as atrizes demonstram bem as características de suas personagens, seja o comportamento debochado e auto destrutivo da Sabina de Kristen Stewart – uma atriz que admiro, embora alguns sempre a coloquem como “inexpressiva”, só pelo seu trabalho em Crepúsculo, ignorando suas ótimas atuações em outros filmes – enquanto Ella Balinska passa muito bem o comportamento frio de sua Jane, além de demonstrar destreza para a ação – e temos um ponto positivo para o humor na composição de Naomi Scott para Elena – a Jasmine do novo Aladdin se sai bem em mostrar o intelecto superior de sua personagem, em meio ao ambiente machista de seu trabalho como cientista – além de ser divertido o modo como ela se surpreende quando se envolve no meio da ação – o que garante uma química interessante entre as três novas protagonistas.
Mas, lamentavelmente, o resto da criação dos personagens se desenvolve de maneira simplificada ou maniqueísta – o que é uma pena, porque até mesmo Elizabeth Banks como Boz se mostra pouco inspirada em sua composição – demonstrando uma certa frieza que mais parece inexpressividade – mais por culpa do roteiro que tem a infeliz tentativa de surpreender, insistindo em causar uma reviravolta no meio, que soa um tanto forçada e quase sem sentido – o que reflete sobre os personagens masculinos – e falo isso tendo consciência de que Hollywood já fez, ao longo de todos os seus anos, a mesma coisa com as personagens femininas coadjuvantes – sendo assim, é quase insuportável aguentar qualquer dialogo vindo dos homens em As Panteras: uma pena ver um grande ator como Patrick Stewart em personagem tão sem personalidade e mal desenvolvido; a curta aparição de Sam Claflin como o empresário Brok também é ridícula, tentando demonstrar sua covardia com um tom de voz forçado – além ainda de se aproveitar pouco de atores coadjuvantes muito bons como Djimon Hounson – que sai de cena quase no fim do primeiro ato. E tem ainda o capanga vivido por Jonathan Tucker, quase que uma imitação do que o vilão de Crispim Glover fazia nos filmes passados, mas, desta vez, sem nenhum humor ou criatividade, soando apenas como um personagem trivial saído de algum filme de 007.
Além dessas questões técnicas e de criação de personalidades, As Panteras sofre de um dos piores males da Hollywood de hoje: o excesso de momentos panfletários ou desenvolvidos simplesmente como marketing – a inserção de música pop por quase todo o tempo tira inúmeras vezes a urgência de certas situações – e a necessidade de colocar as atrizes dançando (algo que era exagerado nos longas passados também) soa artificial e realmente desnecessária – o que vai totalmente contra a ideia de eliminar o sexismo e a falta de personalidade para as personagens.
Enfim, As Panteras só acaba não sendo um desastre por suas três atrizes principais – mas se sabota por ter uma estrutura narrativa totalmente convencional – para não dizer ultrapassada – é melhor em questões de seriedade, se comparado com a série original e os filmes da década passada – mas está longe de ser dinâmico o suficiente para a ação e pouco divertido para ser uma boa comédia. O roteiro e a direção de Elizabeth Banks tem boas intenções, é claro – mas, desta forma, é difícil apreciarmos este filme, que merecia mais conteúdo em torno de suas ótimas atrizes, que, realmente, tem capacidade de fazer tudo o que quiserem – mas uma história melhor contada ajudaria muito elas.
*o filme tem várias cenas durante os créditos finais.