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    Em um Mundo Interior
    Críticas AdoroCinema
    3,0
    Legal
    Em um Mundo Interior

    Introdução ao autismo

    por Bruno Carmelo

    Desde a longa cena de abertura, percebe-se que este documentário possui duas preocupações: ser informativo, transmitindo as circunstâncias do autismo e seu impacto nos familiares, e ser delicado, com trilha sonora doce e olhar respeitoso às pessoas em tela. Os diretores Mariana Pamplona e Flávio Frederico adotam uma louvável postura humanista, mais expositiva do que propriamente investigativa.

    Partindo do pressuposto de que o público seria leigo no assunto, os cineastas desenvolvem uma explicação cronológica e clara. Acompanhamos a descoberta dos primeiros sintomas, a difícil elaboração do diagnóstico, os diferentes graus de autismo, a razão pela qual o transtorno não pode ser considerado doença, o modo de atenuar as limitações com tratamentos especializados etc. Focando-se nas crianças enquanto dá voz aos pais e profissionais da saúde, o documentário deixa que um grupo amplo represente a diversidade do autismo: temos crianças pequenas e adolescentes, meninos e meninas, brancos e negros, de diversas partes do país.

    Em um Mundo Interior é competente em termos técnicos. As filmagens, em diferentes locais e circunstâncias, possuem direção de fotografia e som coesa, sem chamar atenção para si própria. A montagem de precisão cirúrgica combina bem os depoimentos em off com cenas das crianças interagindo com brinquedos ou colegas de classe. O ritmo geral é agradável, nem arrastado nem veloz demais. Cada criança ganha o tempo necessário para se desenvolver em tela, enquanto os diretores evitam sabiamente as lágrimas e o olhar piedoso.

    Em termos cinematográficos, no entanto, o documentário demonstra pouca criatividade e ambição. A exposição linear constitui pouco mais do que se esperaria de uma introdução ao tema, com enquadramentos convencionais e recursos básicos de linguagem. Para um projeto investigando um funcionamento psíquico complexo, seria comum buscar formas poéticas ou metafóricas de representar o autismo. Pelo contrário, o filme limita-se à trilha sonora óbvia (música de suspense quando se mostra um jovem autista mantido preso em casa, “Paciência” de Lenine na conclusão) e aos sorrisos das crianças para transmitir afeto.

    O discurso tampouco se insere num contexto social amplo: sabe-se pouco da responsabilidade do Estado no tratamento de pessoas autistas, ou sobre as controvérsias a respeito da necessidade ou não de medicamentos, questão abordada de modo superficial. O grupo de crianças escolhidas, ainda que amplo, restringe-se a famílias de bons recursos financeiros, capazes de arcar com uma série de especialistas para cuidar dos filhos. As famílias pobres são mencionadas rapidamente na conclusão (a parte “de suspense”), permanecendo longe dos holofotes.

    De modo geral, Em um Mundo Interior lida com perspectivas ideais de tratamento do autismo. Trata-se de uma defesa empática da busca por técnicas especializadas e do trabalho de profissionais da área. Mas seu otimismo constitui um trunfo e uma limitação: ao mesmo tempo em que permite uma bela constatação, impede a articulação de um discurso político e/ou sociológico a partir dos casos observados.

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