Boas intenções
por Lucas SalgadoDizem que de boas intenções o inferno está cheio. Pois bem, o cinema também não fica muito para trás. Todos os anos, temos aqueles chamados feel good movies, ou seja, aqueles filmes feitos para fazer as pessoas se sentirem bem. Normalmente são aquelas histórias bonitinhas, em que o protagonista deve superar dificuldades em nome de uma grande redenção. E longas sobre reality shows se encaixam perfeitamente neste quesito, como vimos em Quem Quer Ser um Milionário? e Apenas uma Chance.
Agora, O Ídolo segue o mesmo caminho. O filme é baseado na história real de Mohammad Assaf, jovem da Faixa de Gaza que participou do Arab Idol, em 2013. Trata-se da versão árabe do American Idol. Desde pequeno, o garoto sonhava em ser artista, tendo uma banda ao lado da irmã e de dois amigos. Eles superam a dificuldade da região para seguir suas paixões, mas apenas Mohammad acaba continuando como artista. Ao saber o Arab Idol, ele vê no programa uma possibilidade de mudar de vida. Ao mesmo tempo, se torna uma voz importante para a causa palestina.
Tendo em vista a história de vida de Assaf, era de se esperar uma obra sobre superação e realização de um sonho, mas também esperava-se um trabalho menos quadrado de um diretor como Hany Abu-Assad, responsável por Paradise Now. Ainda que mostre a pressão sentida pelo artista para representar sua nação, é impressionante o quão apolítico é a produção. Tudo é tratado de forma simplória e superficial.
Assim como no filme citado, temos os costumes e a religião interferindo nas relações entra as pessoas. Mas todo conflito é solucionado de forma fácil. Como toda história do tipo, irá agradar parte do público, que pode até se emocionar nos instantes finais, que destacam a competição.
Ainda que conte com boas atuações, o filme desperdiça um número grande de personagens. O mentor, os amigos, os pais, a amiga/possível interesse amoroso, o contrabandista... Todos subaproveitados. Acaba de o que chama mais a atenção mesmo é sua música.
Ainda que retrate o cenário de destruição e pobreza de Gaza, tudo é feito de forma tão limpa que esvazia a denúncia e fortalece a ideia de embelezamento da miséria. Uma obra repleta de boas intenções. Mas que fica nisso.
Filme visto na 40ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2016.