É comum reclamarmos de algumas péssimas traduções de títulos que os filmes recebem no Brasil. Por isso, desta vez, é preciso fazer justiça e elogiar o título brasileiro. Ao mesmo tempo que resume o espírito do filme, é um título bastante poético. Além disso, como muitas coisas de caráter ambíguo do filme, tanto pode ser referir à personagem principal da história, como a nós mesmos, que como espectadores apenas observamos o desenrolar de uma história quando assistimos a um filme. Ou seja, todos nós, quando vemos um filme, somos um pouco voyeurs como o Armando deste De Longe Te Observo.
A principal característica do filme, já delineada em seu roteiro, mas ampliada pelo estilo de direção e fotografia, é contrariar a lógica comum, presente principalmente no estilo de filme hollywoodiano, em que o espectador é onipresente e onisciente. Assim como Armando, apenas observamos – de longe , mas não sabemos tudo e não estamos presentes em tudo. Propositalmente, a história é cheia de lacunas, coisas que não são ditas e coisas que não são explicadas, deixando para a imaginação do espectador preenchê-las. Ao longo do caminho, o filme vai deixando perguntas sem respostas. Por exemplo, por que Armando e sua irmã não querem a presença do pai, parecendo até temê-lo com um inimigo? Por que Armando toma a atitude que toma ao final do filme? (Nesse caso, eu teria a minha teoria, mas guardo ela pra mim, em respeito ao filme, que quer que cada espectador descubra a sua).
Falando assim, o filme parece cheio de “buracos” na narrativa, mas não é o caso. A história é perfeitamente linear. Mas o passado, as motivações dos personagens são apenas sugeridas e não excessivamente explicadas, como estamos acostumados a ver. Na verdade, De Longe Te Observo é um filme com poucos diálogos e cheio de silêncios. Nem mesmo é acompanhado de uma trilha sonora, para reforçar nosso distanciamento, como simples observadores. Por outro lado, é cheio de dicotomias e antagonismos. A Venezuela rica, dos edifícios de luxo, por onde transita o pai de Armando contrasta com os bairros pobres onde vive e trabalha Élder. O silêncio das cenas interiores é bruscamente quebrado quando se passa para cenas externas, de rua, cheias de barulhos urbanos. Da mesma forma, Armando e Élder não possuem nada em comum. Ao contrário, idade, classe social e temperamento os colocam em extremos opostos.
Tratando de temas bastante delicados, De Longe Te Observo é um filme incrivelmente elegante na sua escritura fílmica. Cheio de enquadramentos e sequências que parecem ter sido milimetricamente planejados. Há muitos planos que, por refletir o comportamento do protagonista, parecem ter sido feitos com câmera escondida, nos fazendo participar do voyeurismo de Armando quando segue seu pai ou procura um novo garoto para levar a seu apartamento. Armando é, no final de contas, o interesse maior e grande trunfo do filme. Seguindo o pai sem coragem de se aproximar. Pagando por companhia, mas não desejando nem ser tocado. Até que Élder surge em sua vida, e nela começa a se introduzir sorrateiramente. Na minha visão, é a rejeição ao papel de figura paterna que no final das contas Élder quer que ele represente, mas algo que ele, por sua vez, ainda busca no pai distante, que parece explicar sua atitude final. Élder provocou demais sua zona de conforto, da qual ele não quer ou não consegue abrir mão.