Não reagi ao final da sessão de Aquarius. Saí do cinema anestesiado, sem saber o que pensar. Filmes complexos como esse não comportam julgamentos de valor, do tipo gostei ou não gostei. À medida que as cenas foram se assentando na memória (imagens, falas, trilha, detalhes), as coisas se tornaram mais Claras. Clara, por sinal, é o nome da personagem de Sônia Braga, sessentona crítica de música, que decide brigar com um conglomerado da construção civil, impedindo que o prédio seja demolido. Com esse fiapo de trama, o jovem e talentoso diretor Kleber Mendonça, fala de memória, tempo, diferenças sociais, perdas, resistência, preconceito, ética, preservação... É um trabalho tão rico que precisaria ser revisto várias vezes para uma análise mais acurada e fiel. Há momentos de uma delicadeza de perder o fôlego. A primeira parte do filme, O Cabelo de Clara, é brilhante. Impossível conter as lágrimas. Aquarius é filme autoral, que não segue fórmulas, não se prende às convenções cinematográficas, não é entretenimento. Foi feito para incomodar, fazer o espectador pensar, refletir, questionar. Não espere o impacto de Cidade de Deus, ou a catarse de Central do Brasil, Aquarius tem outra pegada.