(...)Junto com uma competente fotografia, cada ângulo, cada enquadramento, cada movimento, cada símbolo, cada cena por mais “desnecessária” que possa parecer para o espectador também tem sempre um significado ou uma função específica por trás, o que torna uma narrativa riquíssima em detalhes e uma execução bastante complexa.
Neste contexto, é muito interessante também ver como a câmara não desgruda um segundo de Sonia Braga, a qual se mantém em tela em todas as cenas. Como, através de recorrentes travellings, zoom in-zoom out, etc, a câmara persegue a atriz, seja para nos revele sua reação, seja para contar sua história por seus próprios olhos, pelas suas próprias impressões. O diretor toma o tempo e o cuidado necessários para atingir esta finalidade.
Por óbvio, este filme aborda questões políticas e críticas à sociedade de uma maneira bastante eficaz, quando trata da falta de memória. Mas ele também possui vários outros níveis de interpretação. É um belíssimo trabalho artístico que se aplica à realidade de qualquer pessoa; todos podem se identificar. O apartamento de Clara, mais que um lugar físico, decadente em sua aparência, é o lugar onde seus filhos cresceram, é onde todas as lembranças se encontram, é o seu acervo mais precioso. Em cada objeto, livro, música tem um pedaço dela, um pedaço da sua história de vida.
Quem nunca se apegou a um objeto, a um signo representativo de uma época, de uma viagem, de um antigo amor, de uma amizade em nossas vidas? E isto é que Aquarius representa: a memória preservada e viva e, principalmente, a saudade de um tempo que não volta mais.