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    Um Filme de Cinema
    Críticas AdoroCinema
    3,5
    Bom
    Um Filme de Cinema

    Questões de estética

    por Bruno Carmelo

    O início deste documentário fornece uma falsa pista ao público. Com imagens solenes de um cinema abandonado na Paraíba, coroadas por música clássica e sentimental, o filme parece adentrar o terreno da cinefilia, fazendo uma grande homenagem ao amor pelo cinema. Quando uma tocha queima os marimbondos que tomaram conta do lugar, o espectador pode deduzir que assistirá a um libelo sobre os sacrifícios necessários à arte.

    Ora, a sequência não corresponde em nada à expectativa lacrimosa, pelo contrário. Conversando com alguns dos cineastas mais inventivos e inteligentes em atividade (Ruy Guerra, Júlio Bressane, Lucrécia Martel, Bela Tarr, Ken Loach, Jia Zhang-ke, Karim Aïnouz, Andrzej Wajda), o diretor Walter Carvalho conduz a conversa através de questões teóricas essenciais: Qual é o papel da subjetividade no cinema? Como fazer uso expressivo do som em relação à imagem? O cineasta deve buscar o real, ou justamente aquilo que foge do mundo visível? O cineasta faz o filme, ou o filme faz o cineasta?

    As respostas são detalhadas, ricas em informações, em citações a correntes filosóficas e pensadores em geral. A montagem ágil trata de agrupar as respostas por afinidade de pensamento, às vezes contrapondo ideias diferentes, como o pragmatismo rabugento de Bela Tarr ao idealismo militante de Ken Loach. Um Filme de Cinema fornece material farto àqueles que acreditam no cinema como um coletivo de ideias, e não apenas de filmes. Este é um convite à reflexão teórica, quase acadêmica.

    Talvez por isso, o filme não consegue escapar da frieza no discurso. Os temas possuem tamanha amplitude que não ganham o aprofundamento necessário – cada um deles seria digno de uma tese de doutorado. O uso dos discursos também sofre de desequilíbrio: enquanto Bela Tarr torna-se uma figura central nas conversas, nomes importantes como Asghar Farhadi e Hector Babenco têm direito a poucos minutos. Além disso, o filme não reflete sobre a diferença entre o ponto de vista dos novatos e aquele dos veteranos.

    Walter Carvalho também se perde um pouco na multiplicação de recursos e de estilos, algo que já havia constituído um dos principais problemas de Brincante. A longa digressão sobre Cinema Paradiso fica deslocada no documentário, assim como a recriação singela de uma sessão de cinema, na conclusão. Mesmo assim, Um Filme de Cinema impressiona pela beleza das imagens e pela riqueza das composições, graças à bela fotografia de Lula Carvalho.

    Enquanto isso, a estética adotada para cada entrevista adequa-se ao estilo do entrevistado (em preto e branco para Bela Tarr, granulada para Julio Bressane, lisa e nítida para José Padilha), o que justifica as mudanças de formato e textura neste projeto captado ao longo de 14 anos. Um Filme de Cinema é um documentário atípico, fugindo do amor ao cinema (disponível a qualquer um) para investigar a capacidade de refletir sobre o cinema (algo reservado a poucos).

    Filme visto no 48º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em setembro de 2015.

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