Hollywood é uma ilusão
por Bruno CarmeloOs conservadores anos 1950, no período pós Segunda Guerra Mundial, trouxeram uma onda de filmes muito particulares em Hollywood, destinados ao escapismo. Esta foi uma época de ouro para a criação de novas estrelas e novos astros, modelados pelos estúdios como cuidadosos produtos de marketing, o que incluía aparições forçadas em eventos, atuações em quaisquer projetos determinados pelos diretores e namoros falsos, encenados apenas para os holofotes.
Neste contexto, surgiu Tab Hunter, jovem americano loiro, musculoso e de olhos azuis, que conquistou as garotas da época. Apesar dos conhecimentos dramáticos limitados, foi apadrinhado pelo poderoso Jack Warner e viu sua carreira crescer rapidamente como ator, cantor, modelo e figura popular das capas das revistas adolescentes. Hunter foi vendido como o americano perfeito, bom moço, conservador, interpretando papéis de militares prestes a arrebatar o coração da mocinha virginal. Mas por trás desta imagem, o ator escondia sua homossexualidade e seus relacionamentos com diversas personalidades públicas.
Tab Hunter - Confidencial faz um ótimo trabalho ao revelar a ilusão que cerca o star system americano até hoje, explicando como ela reforça os valores conservadores e patriarcais. O diretor Jeffrey Schwarz demonstra grande prazer em desconstruir o sonho de sucesso através do cinema, citando inúmeros casos de namoros falsos, sexualidades reprimidas e vidas privadas misturadas à vida pública. Sob o controle rígido da Warner, Hunter desfrutava de uma proteção quase mafiosa, que o livrava de qualquer rumor, mas também o forçava a atuar no papel de galã em período integral.
O astro, hoje idoso e aposentado, é responsável pela maioria dos depoimentos, o que obviamente faz com que o espectador conheça acima de tudo o seu próprio lado da história. Hunter se defende, faz questão de ressaltar seu talento dramático, sua ingenuidade e pureza diante de um sistema corrupto. Não é difícil perceber que esta estrela pública continua a usar as imagens – o próprio documentário, no caso – para moldar a sua imagem, o que não retira o interesse do filme, pelo contrário. Isso reforça o caráter manipulador intrínseco ao cinema, algo que foi elevado à enésima potência no caso do regime de estúdios nos Estados Unidos.
Ao mesmo tempo em que critica a lógica ilusória dos tabloides, é irônico que Tab Hunter - Confidencial utilize essa mesma linguagem para cativar o espectador. A grande produção utiliza uma montagem rápida, divertida, com dezenas de fotos animadas, colagens e outros efeitos visuais destinados a tornar o conteúdo mais palatável, mais leve. Schwarz adota o mesmo imperativo do entertainment que critica, fazendo da denúncia da fofoca uma forma de fofoca por si mesma. A desconstrução da imagem é apenas parcial, portanto: o cineasta está tão cativado pelas aparências que não consegue se distanciar do teatro da vida privada.
Filme visto no 23º Festival Mix Brasil de Cultura da Diversidade, em novembro de 2015.