O razoável filme O Escaravelho do Diabo teve uma estreia modestíssima, com horários escassos, espremido entre grandes cartazes.
O filme, de certa maneira, escancara conservadorismo. Aliás, o cinema infanto-juvenil brasileiro sempre foi, em última análise, conservador. Sem o apelo comercial dos blockbusters americanos que enchem os cinemas nas férias escolares, os poucos cineastas brasileiros compromissados com esse tipo de público contornam as dificuldades técnicas com histórias simples, porém engenhosas, poucos efeitos especiais, alguma pitada de romance e humor, personagens críveis e situações realistas.
O filme fez muito bem tudo isso.
O Escaravelho do Diabo é adaptação da obra homônima (e já clássica) da escritora mineira Lúcia Machado de Almeida (1910-2005). A história foi publicada pela primeira vez, em partes, no jornal O Cruzeiro, em 1953. Só foi relançada em 1972, já em formato de livro, ao estrear a série Vaga-Lume, da Editora Ática. O livro foi adotado por décadas pelas professoras do ensino fundamental e médio de todo o País, o que ajudou crianças e adolescentes pegarem gosto pela leitura.
Se no aspecto da forma, o cinema infanto-juvenil brasileiro é conservador, as pequenas "rebeldias" se mostram no conteúdo. Era de se esperar que a adaptação cinematográfica acabasse fazendo "ajustes" nos detalhes do livro, "atualizando-o". Afinal, algo caro como um filme precisa se pagar com a bilheteria. O espectro de público, sob essa ótica, deveria ser maior que as pessoas fãs da obra, que cresceram com ela.
No livro, Alberto é um jovem estudante de Medicina; no filme, é um pré-adolescente (Thiago Rosseti). O filme já o coloca às voltas com gadgets, videogames, internet, televisão, CSI, modernidade. Coisas que evidentemente não havia em 53 ou em 72.
A história do livro se passa na real Vista Alegre, cidade do interior de São Paulo. Já no filme, é na fictícia Vale das Flores. Mas de resto persegue a trama principal, a de um serial-killer que aterroriza a pequena cidade, entregando às vítimas (sempre ruivas) uma caixinha com um escaravelho, antes de matá-las. O jovem Alberto começa a investigar o caso, sem a permissão do Delegado Pimentel (Marcos Caruso, ótimo).
Talvez se tivesse feito uma adaptação fidedigna, respeitando e até reproduzindo a época em que o livro foi escrito, o resultado teria sido indiscutivelmente melhor. Mas seria arriscado demais para o diretor estreante Carlo Milani.
O Escaravelho do Diabo, como o livro, tem uma proposta "paradidática", em querer trazer os jovens para o claudicante mercado do cinema brasileiro infanto-juvenil. Mas deixando isso de lado, é um entretenimento inteligente para ser visto por toda a família.