Juventude enforcada
por Lucas SalgadoAntes de qualquer coisa, é importante destacar que não há nenhuma relação deste filme com Eles não Usam Black-tie, peça de Gianfrancesco Guarnieri que foi adaptada por Leon Hirszman para os cinemas no início dos anos 80. Assim faz pouco sentido o título nacional Eles Só Usam Black Tie, tradução para o original Necktie Youth. O original remete a algo como "juventude de gravatas", que faria mais sentido, uma vez que envolve jovens de boa classe social e ainda faz referência ao fato da trama contar com um suicídio por enforcamento.
Claro que a questão do título é mero detalhe, que não prejudica em nada a experiência do espectador. Mas é importante ressaltar que não há relação com a obra brasileira.
Escrito, dirigido e estrelado por Sibs Shongwe-La Mer, o longa se passa em Joanesburgo. E tem o local quase que como um dos protagonistas. Ao contrário da maioria das produções africanas que entram em cartaz, o filme não debate a natureza pobre da região, mas as relações sociais entre jovens - brancos e negros - de classe alta.
Após o suicídio de Emily, transmitido pela internet para todo mundo, seus jovens colegas tentam lidar com o ocorrido. Os mais próximos sofrem, enquanto outros imaginam se poderiam mudar algo caso tivessem uma melhor relação com ela. Apresentando os principais personagens um a um, com direito a um letreiro com o nome quase ocupando toda a tela, o longa tem elementos de falso documentário.
O filme mescla diálogos entre personagens, com depoimentos prestados para uma equipe de filmagens investigando o suicídio. Também apresenta verdadeiros monólogos sobre a conjuntura social daquela juventude, mas também da cidade e do país.
Passado numa África do Sul pós-apartheid, Eles Só Usam Black Tie mostra como o racismo ainda está presente na sociedade e como não está ligado a conjuntura social. Os negros do filme são todos ricos, mas também convivem com um tratamento repleto de racismo implícito. A obra trata sobre a perda da esperança, focado numa juventude que já cresceu num país mais justo do ponto de vista legal, mas ainda repleto de mazelas, e sem uma figura forte como a de Nelson Mandela.
A juventude retratada não sofre com a pobreza, mas com a pressão de não saber o que ser na vida. Debate depressão e vício na medida que apresenta uma sucessão de cenas de festas e consumos de álcool e drogas, além de muito sexo. Os dois protagonistas principais, Sibs Shongwe-La Mer e Bonko Cosmo estão muito bem, mas o longa sofre um pouco com excesso de personagens. Em algum momento, tudo parece um pouco confuso ao espectador, principalmente pela forma como algumas cenas, envolvendo papéis secundários, são jogadas na tela.
Cabe destacar a direção de fotografia de Chuanne Blofield. O filme é quase todo em preto e branco, usando o colorido para eventuais flash backs, em sua maioria envolvendo a personagem Emily. A apresentação dos personagens também utiliza-se de cor, no caso o nome de cada um aparece com destaque em vermelho.
Eles Só Usam Black Tie é um bom filme, mas que parece não saber muito bem como terminar sua história. Afinal, os conflitos de uma geração, não necessariamente possuem uma solução definitiva. A produção, no entanto, acaba pegando um caminho mais fácil. E mais pessimista. Não é ruim. Mas de menor impacto do que prometia o diálogo entre os protagonistas pouco antes do fim.