Você, com certeza, já ouviu alguma música da cantora, pianista e ativista Nina Simone, porém o rosto dela não vai ser familiar à muita gente. A mim, pelo menos, não era. Muito menos, tive a oportunidade de conhecer a sua história de vida. Para isso, veio o documentário produzido pela Netflix, What Happened, Miss Simone?, dirigido por Liz Garbus. Com certeza, o título da obra faz um trocadilho com a turbulenta vida de Simone, principalmente com o fato de ela, no ápice de sua carreira, ter largado tudo para viver uma pacata vida no continente africano.
Alguns diriam que Nina Simone foi incompreendida. Na realidade, ao assistirmos ao documentário, fica a certeza de que ela pagou o preço pelas suas escolhas, por ter defendido os seus pontos de vista e aquilo em que ela acreditava. Enquanto muitos, durante os opressores anos 60, especialmente para os negros norte-americanos, ficaram às margens dos movimentos em prol da causa negra, Simone foi para o front da linha de batalha, se alinhando diretamente com os líderes do movimento (como Malcolm X e Martin Luther King) e gravando músicas como Mississippi Goddamn, que se tornou um hino ativista da causa negra, e falava sobre o assassinato de quatro crianças negras em uma igreja de Birmingham, em 1963.
Se Nina Simone não conseguiu ficar alheia ao que se passava com seus semelhantes foi porque ela sofreu, na própria pele, o mesmo preconceito. Criada, desde a mais tenra idade, para ser uma pianista clássica, ela não conseguiu uma vaga em um dos mais prestigiados conservatórios de música dos Estados Unidos justamente por ser negra. Foi assim, sendo sempre colocada à margem da sociedade, que Nina Simone se aproximou do jazz e dos blues norte-americano, se transformando numa das principais intérpretes do gênero.
Dona de uma marca musical única, de uma voz forte e uma verdadeira virtuose do piano, Nina Simone foi precursora de artistas como Amy Winehouse, que jogavam todo o seu sentimento em cada música que faziam. Se Nina Simone, ao contrário de Amy, não teve um fim trágico, ela teve a sua própria parcela de tragédias pessoais, como o abuso físico e emocional em seu casamento, o uso constante de drogas e o auto afastamento emocional que se impôs da família (principalmente de sua própria filha) ao decidir se isolar num país do continente africano, antes de ser “resgatada” por amigos para fazer aquilo que ela melhor sabia fazer: emocionar plateias ao redor do mundo.
Por causa desses elementos, What Happened, Miss Simone? nos dá a oportunidade de conhecer um ser humano e uma artista fascinantes. Um filme forte, em vários momentos, que nos mostra, por meio das transformações físicas sofridas por Nina Simone ao longo dos anos, o que foi para ela ter vivido uma existência em prol daquilo que ela mais acreditava. Ela sofreu, verdadeiramente, por ter se dedicado a algo e carregou na pele todo o peso de suas escolhas e toda a bagagem emocional de ter vivido experiências que, pode-se dizer, arrancaram dela toda a energia que tinha a jovem intérprete que, um dia, ela foi.