Embora muitos vejam a Pixar como a jóia da coroa entre as animações da Disney – apesar do longo histórico de animações 2D do estúdio do camundongo –, é inegável que foi Frozen: Uma Aventura Congelante a animação que definiu o gênero nos últimos anos. Baseado na história A Rainha da Neve (de Hans Christian Andersen), a obra dirigida por Chris Buck e Jennifer Lee não apenas conquistou o posto de animação com maior bilheteria da história, como também serviu como um divisor de águas para as histórias de princesa do estúdio, tornando-se referência mundo afora por suas protagonistas fortes e sua trama subversiva, em comparação ao arquétipo Disney de personagens femininas. Não fora surpresa, portanto, quando Frozen II foi oficialmente anunciado.
Felizmente, diferente das sequências típicas de Hollywood e contrariando o histórico de continuações da Disney – ou mesmo algumas da Pixar –, a nova aventura de Elsa e Anna (Idina Menzel e Kristen Bell, respectivamente) passou longe de tornar-se um caça-níquel genérico ou esquecível. Pelo contrário, Frozen II soa como uma evolução da trama, uma bem-vinda “parte dois” que complementa o primeiro filme a medida que avança com o desenvolvimento dos personagens. A nova aventura trata-se principalmente do amadurecimento, algo que não fica restrito a dupla Elsa e Anna, mas também envolve Kristoff (Jonathan Groff) e até mesmo o boneco de neve Olaf (Josh Gad), que não perde o timing cômico e equilibra as piadas com momentos de pura filosofia durante sua “adolescência”. Para a rainha do gelo e sua irmã porém, essa jornada irá ser muito mais pessoal, trazendo à tona os medos e anseios de ambas e a relação que elas possuem entre si e com sua própria história, envolvendo seus pais e até a origem dos poderes de Elsa.
Assim, a jornada de libertação do primeiro filme dá lugar a uma história de reconciliação. Em Frozen II a grande sacada dos diretores é revisitar o passado, desde uma história de ninar do rei Agnarr (Alfred Molina) para as pequenas princesas sobre uma floresta encantada que conheceu na infância até o encontro com gerações anteriores que, em um conflito, desestabilizaram a magia que cerca Arendelle. A partir daí, a trama ganha um escopo mais grandioso e urgente, sendo possível temer pelo destino dos personagens ao adentrarem na floresta atrás do chamado que somente a rainha do gelo ouve. Essa caraterística, por sua vez, se reflete nos aspectos técnicos da obra, como a técnica de animação – que permite nuances mais sombrias em momentos pontuais – e na trilha sonora instrumental, novamente orquestrada por Christophe Beck, carregada de tons folclóricos do norte europeu e é um show à parte.
O aspecto mais chamativo do filme, entretanto, é mérito dos animadores, pois nota-se um esforço para explorar melhor todos os elementos da natureza trazidos à jornada de Elsa e trazê-los à tela com o melhor gráfico possível. O primeiro filme já tinha momentos impressionantes com a protagonista criando e manipulando gelo e flocos de neve – vide a cena entoada pela famosa “Let It Go” – e, posteriormente, o estúdio deu um passo à frente com Moana, mais precisamente na animação da água. E aqui temos um salto gráfico ainda mais marcante, não apenas nos poderes de Elsa – agora muito mais presentes e versáteis –, mas também nas maravilhosas cenas no mar, onde gelo e água se misturam em uma das mais belas sequências do gênero nos últimos anos. Momentos em que os personagens interagem com fogo ou até mesmo vento também surgem com uma fluidez que encanta.
A beleza visual, entretanto, não consegue disfarçar as falhas do texto que por vezes soa um tanto desestruturado. Embora haja sinais de que os diretores tentaram se afastar ainda mais do lugar comum – por exemplo, optando por não ter um vilão de fato –, o segundo ato acaba se tornando problemático ao dividir seu foco em muitos núcleos. Como já dito, a jornada não é apenas de Elsa e Anna, portanto o texto por vezes se dobra à necessidade de desenvolver os outros personagens que poderiam ser “apenas” um alívio cômico. Ficar neste meio-termo, entretanto, incomoda e fragmenta o meio do filme, que não se perde completamente devido o carisma dos personagens e as boas gags relacionadas a eles – a música principal de Kristoff, por exemplo, é um dos melhores momentos da obra. Há, contudo, um ganho considerável no desfecho do longa, que se sai muito melhor na resolução dos conflitos do que o filme anterior, este menos preocupado em consolidar uma mitologia própria.
Talvez Frozen II não marque uma nova fase para as animações como o primeiro filme, tampouco traga uma canção tão presente quanto Let it Go, mas isso não é problema diante do êxito ao mostrar-se uma obra mais madura – assim como os fãs do original – e como um ótimo desfecho para os personagens apresentados anos atrás. Ainda é cedo para dizer se novas aventuras congelantes irão retornar aos cinemas, mas uma coisa é certa: a mitologia construída por Chris Buck e Jennifer Lee sugere caminhos muito interessantes para serem explorados no futuro. E isso, acima de tudo, justifica perfeitamente a sequência.