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    A Grande Jogada
    Críticas AdoroCinema
    2,5
    Regular
    A Grande Jogada

    Conflito de interesses

    por Francisco Russo

    Às vezes, certas características de trabalho ficam tão entranhadas que rapidamente se tornam uma assinatura pessoal, facilmente reconhecida em tudo que se faz. Se tal peculiaridade é mais comum em diretores ou atores, seja por escolhas de trabalho ou mesmo cacoetes repetidos em diferentes papéis, em casos muito específicos pode-se também percebê-las em roteiristas. É o caso de Aaron Sorkin, roteirista e também diretor de A Grande Jogada.

    Por mais que tenha estourado de fato ao ganhar o Oscar de roteiro adaptado por A Rede Social, Sorkin já tinha construído uma sólida carreira na TV, especialmente graças à série West Wing. Os diálogos ágeis e aprofundados em um ritmo verborrágico também estiveram nos bem-sucedidos O Homem que Mudou o Jogo, Steve Jobs e a série The Newsroom, que lhe renderam (mais) indicações. Ao analisar a história de A Grande Jogada, não é difícil compreender o porquê de seu interesse como roteirista. Só que ir além e assumir também a cadeira de diretor foi um passo em falso.

    Muitos dos problemas do longa-metragem surgem devido às limitações de Sorkin em dosar o ritmo ao longo da história. Se a primeira metade é extremamente didática, algo até mesmo necessário diante dos flashbacks de quando a personagem principal era esquiadora e a própria construção do universo em torno de Molly Brown, o trecho final traz saltos mal explicados e ainda cenas que beiram o patético, onde o deus ex machina rola solto de forma a esmiuçar as (várias) pontas em aberto da trama. É o caso do estranhíssimo reencontro de Molly com seu pai (Kevin Costner, burocrático), à beira de uma pista de patinação.

    Além disto, há um sério problema na forma como a dualidade de sua personagem principal é apresentada. Anti-heroína por natureza, Molly deseja enriquecer mas com uma ética própria, no sentido de proteger seus clientes. Jessica Chastain até traz dignidade e força à protagonista, se equilibrando nesta linha tênue, mas o personagem de Idris Elba é construído com o propósito único de contestá-la, a todo custo. Por mais que certas provocações sejam compreensíveis, especialmente para alguém que assume a função de advogado de defesa, tamanha insistência contínua faz com que o personagem seja não só previsível, mas também burocrático. O problema, é bom ressaltar, não está propriamente na atuação de Idris Elba, mas na forma como seu personagem se desenvolve ao longo da trama - o que não o impede de ter uma boa cena, já perto do final, quando defende sua cliente.

    Diante destas limitações narrativas, resta ao filme a boa dinâmica envolvendo a clientela de Molly. É nesta fauna tão diversa, onde comportamentos e interesses são retratados sob a ótica analítica da personagem principal, que o filme atrai algum interesse. Chama também a atenção a escalação de elenco, feita de forma que Jessica Chastain não tenha "concorrentes" em cena - o nome mais conhecido é o de Michael Cera, cuja presença vale mais pela analogia com a fama de seu personagem na história. O filme é dela, e ponto final!

    Calcada na imagem e boa atuação de sua protagonista, A Grande Jogada pouco tem a oferecer além disto. Cansativo pela verborragia típica do Sorkin roteirista, o filme ainda carece de maior fluidez na narrativa devido ao Sorkin diretor, o que por vezes traz a sensação de que a história gira em círculos, apenas alternando seus clientes-coadjuvantes. Quando enfim precisa dizer a que veio, tudo desanda - e feio! - nesta tentativa em mostrar uma visão distorcida do velho sonho americano de enriquecer na terra das oportunidades.

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